Previdência: muitos fatos e uma opinião. Por Alexandre Schwartsman

Previdência: muitos fatos e uma opinião

Por Alexandre Schwartsman

…estima-se que pensões por morte pagas pelo INSS representem algo como 3,6% do PIB, contra uma média mundial equivalente a 1,4% do PIB, evidência de outra distorção que tem pesado no aumento persistente

Artigo publicado originalmente na Folha de S. Paulo, coluna do autor, edição de 14 de dezembro de 2016

O gasto público em aposentadorias e pensões, incluindo tanto trabalhadores do setor privado (RGPS) como funcionários públicos (RPPS), atingiu cerca de R$ 700 bilhões no ano passado, pouco menos de 12% do PIB. Ao mesmo tempo, porém, somos um país relativamente jovem: a população acima de 60 anos (“idosos”) corresponde a uns 10% do total, proporção não muito distinta da observada em outros países latino-americanos, como o México ou o Chile.

Apesar disto, países com estrutura etária similar à nossa gastam muito menos; nossa despesa, na verdade, se assemelha à de países bem mais velhos (e muito mais ricos), como a Alemanha, onde os “idosos” correspondem a um quarto da população total. Trata-se de um fato, não uma opinião.

Em consequência, deve ficar claro que, se nada for feito, a despesa previdenciária seguirá crescendo acima do PIB, refletindo principalmente o envelhecimento natural da população. Em 2026 os “idosos” representarão perto de 18% da população, proporção que se elevará para 22% em 2036, trazendo o gasto para a casa de 20% do PIB, superior ao de qualquer país no mundo hoje.

Isto é o reflexo de um conjunto de distorções. No que se refere ao RGPS, por exemplo, não há – ao contrário da experiência mundial – idade mínima para aposentadoria. Assim, a idade média de quem se aposenta pelo tempo de contribuição gira em torno de 55 anos.

Não parece cedo demais à luz de uma expectativa de vida ao nascer de 72 anos, mas esta comparação é equivocada. O dado relevante, que pode ser obtido nas tábuas de mortalidade do IBGE, é a expectativa de vida de quem atinge 55 anos, valor que se encontra hoje próximo a 81 anos. Não é por outro motivo que se propõe não apenas a fixação de uma idade mínima (no caso, 65 anos), mas a previsão de ajustes periódicos com base no aumento da expectativa de sobrevida.

Da mesma forma estima-se que pensões por morte pagas pelo INSS representem algo como 3,6% do PIB, contra uma média mundial equivalente a 1,4% do PIB, evidência de outra distorção que tem pesado no aumento persistente do gasto previdenciário.

Por fim, sem querer esgotar o (longo) capítulo das distorções, nota-se que o valor médio das aposentadorias e pensões do funcionalismo supera, em muito, o equivalente do INSS. Estudo recente de Paulo Tafner revela que a média destes pagamentos no caso do governo federal (pouco menos de 1 milhão de aposentados e pensionistas) atingiu R$ 10,6 mil/mês no ano passado, contra R$ 1 mil/mês no caso do INSS (incluindo amparos assistenciais). Isto sem falar nos regimes previdenciários estaduais, origem de boa parte de seus problemas fiscais hoje observados.

… Não é perfeita, mas sem ela não haverá como reconquistar a estabilidade perdida nos últimos anos.

Nenhuma destas distorções será resolvida cobrando a dívida ativa do INSS (em grande parte dívida de empresas falidas e que não cobriria um ano do gasto), nem com o fim das renúncias fiscais, duas supostas panaceias frequentemente apregoadas como alternativas à reforma. Nada contra, mas não evitariam que o gasto continuasse a crescer de maneira insustentável.

A reforma previdenciária proposta pela atual administração representa mais uma oportunidade para o país começar a corrigir os rumos que nos levaram à crise atual. Não é perfeita, mas sem ela não haverá como reconquistar a estabilidade perdida nos últimos anos.

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Alexandre-BSB• * ALEXANDRE SCHWARTSMANDOUTOR EM ECONOMIA PELA UNIVERSIDADE DA CALIFÓRNIA, BERKELEY, E EX-DIRETOR DE ASSUNTOS INTERNACIONAIS DO BANCO CENTRAL DO BRASIL É PROFESSOR DO INSPER E SÓCIO-DIRETOR DA SCHWARTSMAN & ASSOCIADOS

@alexschwartsman
aschwartsman@gmail.com

(O Blog A MÃO VISÍVEL, de Alexandre Schwartsman, integra o Site Chumbo Gordo, no http://www.chumbogordo.com.br/categorias/a-mao-visivel/)

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