Muro das lamentações. Por Alexandre Schwartsman

Muro das lamentações

Por Alexandre Schwartsman

…De qualquer forma, porém, a verdade é que não só a inflação observada começou a cair em resposta à fraqueza da economia (ao contrário do que afirmavam os keynesianos de quermesse), mas também as expectativas de inflação cederam fortemente…

Artigo publicado originalmente na Folha de S. Paulo, coluna do autor, edição de 4 de janeiro de 2017

2017 deverá ser um ano melhor do que 2016, principalmente porque, se não fosse o caso, o melhor seria mudar de país. Com queda estimada do PIB ao redor de 3,5% (sobre redução de 3,8% em 2015), inflação pouco inferior a 6,5%, desemprego batendo em 12% e um sentimento de desesperança que parece ter contaminado a todos, o ano que se encerrou foi dos piores da nossa história. Neste sentido, é difícil que 2017 consiga ser ainda pior.

A melhor notícia que temos é o comportamento recente da inflação. Há cerca de um ano prevalecia entre analistas o temor que houvéssemos atingido uma situação de dominância fiscal, isto é, uma deterioração tão significativa das contas públicas que o Banco Central perderia a capacidade de controlar a inflação, pois qualquer elevação da taxa de juros só aumentaria a percepção de descontrole da dívida pública, levando à fuga de capitais e inflação ainda mais alta.

Em retrospecto, não chegamos a tanto (uma das poucas previsões que acertei), talvez porque as medidas de ajuste fiscal, ainda que graduais e com efeito demorado, tenham sido, por ora ao menos, suficientes para convencer o público que a trajetória de endividamento do país não será explosiva.

De qualquer forma, porém, a verdade é que não só a inflação observada começou a cair em resposta à fraqueza da economia (ao contrário do que afirmavam os keynesianos de quermesse), mas também as expectativas de inflação cederam fortemente. A inflação esperada para 2017, que chegou a atingir 6% no começo de 2016, recuou para 4,8%, enquanto a expectativa para 2018 veio de 5,5% para 4,5%.

Com as expectativas de inflação novamente ancoradas, o BC pode agora reduzir as taxas de juros, estimulando a atividade sem ameaçar o cumprimento da meta. O consenso capturado pela pesquisa Focus ainda sugere a Selic ao redor de 10% no final de 2017, mas já há quem aponte um processo mais longo (não necessariamente mais rápido) de redução da taxa básica de juros que poderia nos levar a valores de um dígito ao final do afrouxamento monetário, em particular se for aprovada a reforma da Previdência.

Historicamente reduções da taxa real de juros costumam afetar a demanda interna, especialmente o consumo, com defasagem ao redor de dois trimestres, indicando um efeito mais visível sobre a atividade a partir de meados deste ano.

Ainda assim, o crescimento em 2017 deverá ser baixo, em parte pelo efeito estatístico negativo de 2016. Conforme discutido em coluna recente, caso o PIB do quarto trimestre do ano passado (a ser conhecido no início de março) caia em torno de 0,5%, o carregamento estatístico deverá ser negativo e relativamente elevado (-0,9%).

Isto significa que, para manter o PIB de 2017 igual ao de 2016, seria necessária uma taxa média de expansão trimestral na casa de 1,5% ao ano, enquanto um aumento do PIB da ordem de 0,5% em 2017 precisaria de um ritmo trimestral de crescimento pouco inferior a 2,5% ao ano.

Neste sentido, à parte revisões dos dados passados (ressalva que sempre precisa ser feita), dificilmente observaremos aumento superior a 0,5% este ano.

Posto de outra forma, podemos esperar recuperação lenta da economia, mais vigorosa apenas na segunda metade do ano. Em outras circunstâncias, lamentaríamos; nas atuais, também.

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Alexandre-BSB• * ALEXANDRE SCHWARTSMANDOUTOR EM ECONOMIA PELA UNIVERSIDADE DA CALIFÓRNIA, BERKELEY, E EX-DIRETOR DE ASSUNTOS INTERNACIONAIS DO BANCO CENTRAL DO BRASIL É PROFESSOR DO INSPER E SÓCIO-DIRETOR DA SCHWARTSMAN & ASSOCIADOS

@alexschwartsman
aschwartsman@gmail.com

(O Blog A MÃO VISÍVEL, de Alexandre Schwartsman, integra o Site Chumbo Gordo, no http://www.chumbogordo.com.br/categorias/a-mao-visivel/)

 

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