Joaquim II (ou A Capitulação)

Já houve um ministro da
Fazenda com o mesmo nome no período republicano (Joaquim Murtinho, o responsável pela estabilização da economia depois do Encilhamento), mas a numeração aqui
não se refere a isto e sim a Joaquim Levy ter sido a segunda opção da
presidente após a constrangedora recusa de Luiz Carlos Trabuco na semana
passada.
Obviamente não me
escapa (nem a ninguém) a deliciosa ironia de a presidente que demonizou
banqueiros durante sua campanha – ladrões de comida de criancinhas, lembram-se?
– não apenas chamar um deles para gerir a economia, mas também, depois de
rejeitada, insistir no tema (e na instituição financeira!) para atrair para seu
governo um economista identificado com precisamente o oposto do que praticou (e
pregou) nos últimos quatro anos.
Trata-se, sujeito ainda
a algumas considerações, de reconhecimento explícito do fracasso épico da “nova
matriz macroeconômica”. A combinação de frouxidão fiscal, descaso com a inflação
e voluntarismo, seja nas tentativas de intervenção na taxa de câmbio, seja na
repetida intromissão do governo no domínio econômico, teve como resultado
crescimento medíocre, inflação alta, desequilíbrios externos consideráveis e
redução do ritmo de expansão da produtividade, uma rara combinação de
incompetência.
Muito embora o futuro
ex-ministro da Fazenda e sua arrebatadora equipe tenham responsabilidade direta
pelo insucesso, deve ser claro que esta se limita à execução da malfadada
política econômica, ou seja, à de fantoches que jamais almejaram virar meninos de verdade. Não há dúvida que a
formulação do fiasco emanou diretamente da presidente, cujas opiniões
equivocadas sobre a economia são de conhecimento geral e amplamente comentadas
neste espaço.
Por conta disto a
presidente enfrenta um problema difícil: como convencer o distinto público
acerca de sua firmeza de propósito no que se refere à mudança de rumo do país?
Bom, para começar,
precisa de um ministro da Fazenda que não se sujeite ao papel de marionete,
mensagem que lhe parece ter sido passada de forma insistente pelo
ex-presidente. Neste sentido podemos entender a escolha de executivos do setor
financeiro indicados por Lula: a provável reação negativa do mercado, assim
como possivelmente do próprio ex-presidente, tornaria muito custosa uma
eventual demissão, ou seja, a “autonomia operacional” (perdão pela gargalhada
íntima) do novo ministro seria, de alguma forma, assegurada pela ameaça de “destruição
mútua”.
Posto de outra forma,
falamos do equivalente a amarrar as mãos da presidente para que ela não possa
mais gerir a economia da mesma forma desastrada que fez de 2011 para cá.
Resta, porém, saber se
a presidente realmente entendeu a extensão do problema e, se for o caso, tem
mesmo a disposição para limitar de forma radical seu próprio poder.
A rejeição de Luiz
Carlos Trabuco, quando boa parte da imprensa dava por certa sua indicação, oferece
pistas importantes. Não há como se convencer que derive das questões
corporativas alegadas naquele momento. Este problema já existia antes da
conversa com a presidente e é difícil acreditar que seja a causa para a
desistência já aos 44 minutos do segundo tempo.
Parece-me que o cerne
da discussão – como não poderia deixar de ser – refere-se à real extensão do
poder ministerial. Trabuco, no meu entender, teria recusado o cargo por não ter
garantias suficientes quanto à sua autonomia.
Caso esteja certo a
este respeito seriam também remotas as chances que a presidente tenha oferecido
condições mais vantajosas a Levy do que as apresentadas a Trabuco. A autonomia
do ministro, no caso, terá mesmo que se equilibrar no delicado balanço da
“destruição mútua”, base muito frágil para assentar o futuro do país,
considerados os estragos dos últimos anos.

Há muito a fazer para
corrigir o rumo, mas tudo indica que a presidente ainda não se deu conta do
tamanho da encrenca.
A solução
(Publicado 26/Nov/2014)

5 thoughts on “Joaquim II (ou A Capitulação)

  1. os textos sao otimos – mas aos poucos estou comecando a apreciar as imagens do estilo "paintbrush art" mais do que todo o resto. Quase um Warhol.

  2. Gianeti, em outras palavras, chegou na mesma questão.

    Será apenas uma encenação pros mercados se acalmarem? apenas um ganha-tempo para a continuidade da agenda de sovietização com lula 2 em 2018?

  3. Até hoje a presidente diz que a inflação está sobre controle, isso indica que ela ainda não entendeu o tamanho do problema criado pela mesma.

  4. Parece que os correios vao ter prejuizo no ano fiscal. Na nova matriz economica, nem monopolios estao a salvo.

    Como fica a contabilidade do buraco das estatais? O balancete das estatais caem na conta consolidada do deficit/superavit ou a absorcao so ocorre quando ha injecao de capital ou dividendos pagos?

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