A primeira delação premiada do Brasil. Por Cesar Maia

NA PRIMEIRA “DELAÇÃO PREMIADA” NO BRASIL, ACORDO NÃO FOI CUMPRIDO! FOI TAMBÉM A PRIMEIRA “AÇÃO CONTROLADA”!

               Por Cesar Maia

Silvério dos Reis -contratador de entradas, fazendeiro e proprietário de minas- participava intensamente da conspiração. Estava a par de tudo. A partir de um certo momento, aceitou a proposta de delatar o movimento. O fez através do que, no caso JBS, se chamou de “ação controlada”. Registrou tudo…
Publicado originalmente  no Ex-Blog de Cesar Maia, post de 3 de julho de 2017
1. Na primeira “delação premiada” registrada na história brasileira, o delator entregou todos os envolvidos. Na “Devassa da Devassa”, o historiador Kenneth R. Maxwell – analisando em profundidade as razões, os fatos e os desdobramentos da Inconfidência Mineira- demonstra que não se tratava de nenhuma luta pela independência do Brasil.
2. Conforme Kenneth Maxwell, os principais articuladores do movimento eram contumazes sonegadores e, por isso, encabeçavam a lista dos devedores da dívida ativa da coroa portuguesa. A reação contra a derrama –aumento do imposto sobre o ouro – serviu como pretexto, de forma a adensar o movimento.
3. Mas o objetivo básico era cancelar a dívida ativa dos sonegadores, entre estes o Desembargador e poeta Tomás Antonio Gonzaga; advogado e poeta, Alvarenga Peixoto; advogado, minerador e poeta Claudio Manoel da Costa (que se suicidou); Coronel Comandante Joaquim Silvério dos Reis; Cônego Luís Vieira da Silva, etc. Ao todo, 37 denunciados foram presos, julgados e condenados, num processo que durou quase 3 anos.
…A delação seria premiada com gratificação em ouro; o cancelamento de seu débito; o cargo público de tesoureiro da bula de Minas Gerais, Goiás e Rio de Janeiro; uma mansão como morada; pensão vitalícia; título de fidalgo da Casa Real; fardão de gala e hábito da Ordem de Cristo. Nada disso foi cumprido.
4. Silvério dos Reis -contratador de entradas, fazendeiro e proprietário de minas- participava intensamente da conspiração. Estava a par de tudo. A partir de um certo momento, aceitou a proposta de delatar o movimento. O fez através do que, no caso JBS, se chamou de “ação controlada”. Registrou tudo. Em acordo com os investigadores, entregou tudo: nomes e fatos, local de reuniões na casa de Cláudio Manoel da Costa.
5. Todos foram presos, até Silvério dos Reis, este por um período curto, de forma a não chamar a atenção sobre a fonte das denúncias e os riscos por estar junto com os demais. O acordo de delação premiada de Silvério dos Reis tinha como elemento central o perdão de toda sua dívida ativa, a maior de todas.
6. A leitura dos atos por crime contra o Estado –lesa majestade – durou 23 horas. Todos condenados, a maior parte à morte. Os condenados reagiram gritando. Mas, no final, foi lida uma decisão da Rainha Maria I de Portugal, transformando as penas de mortes em degredos perpétuos, asilos temporais… O cônego e os padres envolvidos tiveram uma pena “sigilosa”. Apenas o alferes Tiradentes foi condenado à morte.
7. A delação seria premiada com gratificação em ouro; o cancelamento de seu débito; o cargo público de tesoureiro da bula de Minas Gerais, Goiás e Rio de Janeiro; uma mansão como morada; pensão vitalícia; título de fidalgo da Casa Real; fardão de gala e hábito da Ordem de Cristo. Nada disso foi cumprido.
8. No final, Silvério dos Reis ganhou liberdade e mobilidade, indo a Portugal, à Europa, e voltando ao Brasil pobre, sofrendo ataques e, no final, indo morar no Maranhão, sempre escondido pelos riscos pessoais. Faleceu em 1819, 30 anos depois do início de sua delação.

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 Cesar Maia, do DEM/RJ, ex-prefeito do Rio de Janeiro.

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