Menos do mesmo

O resultado do PIB divulgado na semana passada
foi decepcionante, não só pelo número em si, metade daquilo que todos esperavam
(eu inclusive!), mas também, e principalmente, pela sua composição. O
investimento cedeu pelo quinto trimestre consecutivo, acumulando queda de quase
6% desde o pico observado em meados de 2011. Tomados como proporção do PIB os
investimentos caíram de 19,4% no segundo trimestre de 2011 para 18,1% no
terceiro trimestre de 2012, nível mais baixo desde o final de 2009, quando a
economia ainda se recuperava da crise.
Não há como (nem porque) minimizar as
consequências deste processo. No curto prazo o investimento responde por
parcela relevante da expansão da demanda interna. Os demais componentes desta
última (o consumo das famílias e do governo) têm mostrado certo vigor,
crescendo a taxas médias próximas a 3,5% ao ano nos últimos trimestres,
sugerindo que a baixa expansão da demanda doméstica resulta da fraqueza do
investimento.
A médio e longo prazo, porém, as consequências
são ainda mais graves, pois afetam a capacidade de crescimento sustentado.
Minhas estimativas (com o auxílio inestimável de Cristiano Souza) sugerem que
cada 1% do PIB a mais de investimento eleva o crescimento sustentável entre
0,20% e 0,25% ao ano. Se nossa avaliação estiver correta, portanto, a queda
observada desde o segundo trimestre de 2011 nos custou algo em torno de 0,3% ao
ano. Pode não parecer muito, mas em dez anos equivale a uma redução do PIB da
ordem de 3%, isto é, cerca de um ano de crescimento perdido a cada dez.
O ponto central, no entanto, é entender os
motivos por trás do fraco desempenho do investimento. Há certo consenso que o ambiente
externo, notadamente a incerteza que cerca a crise europeia, deva ser
responsabilizado pela timidez da inversão em função da elevação dos riscos a
que submete qualquer projeto de investimento.
Não estou, porém, plenamente convencido. Muito
embora este elemento possa desempenhar algum papel no processo, ele me parece
insuficiente para explicar a magnitude da queda observada no período recente.
Com efeito, se a crise internacional fosse o
fator determinante da fraqueza do investimento deveríamos observar um processo
de queda sincronizada em vários países, em particular aqueles que compartilham
(ou melhor, compartilhavam) certas
características com o Brasil, como o peso das commodities nas exportações, assim como o regime monetário e
cambial.
Isto, porém, não ocorre. A queda dos investimentos
no Chile, Colômbia e Peru foi semelhante à ocorrida no Brasil entre 2008 e
2009; nos últimos trimestres, contudo, enquanto o investimento nacional segue
em queda livre, naqueles países se observa precisamente o contrário.
Creio que a raiz do problema no Brasil está
relacionada à evolução medíocre da produtividade. Tomada a valor de face, a
propósito, a produtividade teria caído, visto que o PIB cresceu 0,9% entre o
terceiro trimestre de 2011 e o mesmo período de 2012, enquanto o emprego
cresceu 1,7%. Numa interpretação mais caridosa, porém, a tendência subjacente permaneceria
positiva, porém modesta, em torno de 1,3% ao ano.
Já o salário real médio tem crescido entre 3% e
5% ao ano, o que implica elevação do custo real unitário do trabalho na casa de
2% a 2,5% ao ano, ou seja, redução equivalente dos lucros. Dado que o
investimento depende crucialmente da evolução esperada dos lucros não é difícil
concluir que este fenômeno deva se encontrar no cerne do fraco desempenho da
formação de capital.
Some-se a isto um governo intervencionista, que
vem modificando drasticamente as regras do jogo, e temos a explicação para o
quadro observado. Noto, por fim, como se a conclusão não fosse triste o
suficiente, que não há sinal de mudança de rumo na política econômica que possa
alterar o estado das coisas. Podemos nos acostumar com o baixo crescimento: ele
veio para ficar.
Agora vai!
(Publicado 5/Dez/2012)

30 thoughts on “Menos do mesmo

  1. Bom dia Alexandre!
    O governo não estaria segurando gastos visando a próxima eleição?
    A memoria do povo lembra de eventos mais próximos. abs

  2. Viram o texto do Chico Lopes no Valor sobre o peso negativo do setor financeiro no pib?

    Segundo ele, problemas na metodologia derrubaram o pib do setor, gerando ruído no pib total. O q acham?

    Btw, "O", Anpec tá chegando!

  3. Alex,

    Em um post antigo (sinceramente não me recordo a data) você fez uma análise de ativo x passivo dos bancos usando dados do BC mostrando que na verdade uma redução da taxa de juros os beneficiaria, logo a teoria da conspiração de que "os juros são altos porque banqueiro ganha dinheiro com isso" que os queinesianos de quermesse adoram estaria errada.

    Vendo os resultados do PIB bastante afetados pelo resultado do setor bancário pela redução na marreta de spread bancário e taxa de juros, como fica essa análise?

    Att,

    JB

  4. Alex, geralmente os juros baixos impulsionam os investimentos ou os investimentos permitem juros baixos? Ou não existe causalidade, somente correlação entre eles?
    Dantas

  5. Alexandre,

    Adoro seus textos, mas desse eu discordo.

    Não há qualquer evidência de relação sistemática entre taxa de investimento e custo unitário do trabalho. Se isso está ocorrendo neste momento, acredito ser mera coincidência, pois não há qualquer regularidade empírica envolvida entre tais variáveis.

    Com efeito, a variável que parece melhor ter poder explicativo sobre a taxa de investimento é o grau de utilização da capacidade, que está em patamares relativamente baixos neste momento para o caso da economia brasileira.

    Gostaria muito de poder dialogar com você. Caso eu esteja errado, favor me corrigir.

    Att,
    RMB

  6. A presidenta está encalacrada com o Guido, pq tirar ele e sua equipe soará mal, pois ela avalizou a política econômica, portanto reconhecer a incompetência não parece que seja uma opção factível. É mais do mesmo…

  7. Bem Alexandre, então a culpa pelo fraco desempenho do PIB está na produtividade baixa.

    Logo, nao da pra culpar a política da Dilma por isso, uma vez que nenhuma política tem efeito imediato nesse fator, é algo de medio a longo prazo.

    O salario cresce, ainda assim o empresario contrata mais mesmo que o trabalhador vá produzir pouco, mas nao investe em capital fixo, mesmo este estando mais barato que outrora. Ou seja, está sem visao de medio e longo prazo. No fim isso recai nos preços.

    A minha pergunta é: tivesse o BC mantido os juros mais altos e o governo contido mais os gastos, hj estariamos crescendo mais? Dilma desonerou a folha e reduziu impostos por um lado, mas por outro mexeu num marco regulatorio; isso é suficiente, ou tao relevantes pra impactar o PIB tao intensamente?

  8. Alex, quanto você estima ser a taxa natural de desemprego para o Brasil hoje?

    Não deveríamos estar vendo desaceleração no mercado do trabalho com esse crescimento pífio?

    Abraços

  9. Este artigo comuna com a minha visão. O modelo atual está quase esgotado.

    Acredito que devemos reformular o conceito de crescimento e de riqueza, pois não estão em sintonia com qualidade de vida.

    Talvez o baixo crescimento nos ensine algo positivo, nos incentivando a mudar políticas.

    Não vejo outro caminho senão a mudança para o crescimento de baixo carbono (transporte de massa, energias limpas, etc.)e investimentos pesados em qualificação de pessoas (técnico + valores).

  10. Alexandre,
    Existe um ponto que explica parte do baixo crescimento econômico do Brasil desde 2010 que ninguém está comentando: a queda da população economicamente ativa entre 2009 e 2011, segundo a PNAD 2011. Caiu de 101 milhões em 2009 para 100 milhões em 2011. Essa tese que a renda familair está forte com o PIB fraco é xaropada da FGV. A renda per capita do país cresceu 8,4% entre 2009 e 2011 enquanto a renda domiciliar per capita cresceu apenas 5,7% nesses 2 anos, segundo a PNAD 2011. Olho na PEA!
    Fonte:
    ftp://ftp.ibge.gov.br/Trabalho_e_Rendimento/Pesquisa_Nacional_por_Amostra_de_Domicilios_anual/2011/tabelas_pdf/sintese_ind_4_1_1.pdf

  11. "Vendo os resultados do PIB bastante afetados pelo resultado do setor bancário pela redução na marreta de spread bancário e taxa de juros, como fica essa análise?"

    Continua correta (http://maovisivel.blogspot.com.br/2011/11/o-avesso-do-avesso.html). De fato escrevi que:

    "Alguns dirão que o lucro dos bancos vem dos spreads (a diferença entre a taxa de aplicação e captação de recursos), o que é verdade, mas, se bem leram o que foi escrito acima, terão notado que a queda da Selic leva precisamente ao aumento do spread nos empréstimos já existentes, como definido acima."

    A questão era se a queda da Selic reduzia o lucro dos bancos: não ela aumenta o lucro dos bancos. Já a queda do spread reduz o lucro dos bancos (duhhh…)

  12. "Bem Alexandre, então a culpa pelo fraco desempenho do PIB está na produtividade baixa.

    Logo, nao da pra culpar a política da Dilma por isso, uma vez que nenhuma política tem efeito imediato nesse fator, é algo de medio a longo prazo."

    Tremendo non sequitur, claro que a produtividade reage – entre outras coisas – ao ambiente de negócios e quem conversa com qualquer empresário fora do círculo que recebe subsídios deve ter notado que o ambiente de negócios não é dos melhores. Como não sou presidente da República, a culpa não é minha. De quem será?

    "A minha pergunta é: tivesse o BC mantido os juros mais altos e o governo contido mais os gastos, hj estariamos crescendo mais? "

    Desconfio que não teríamos crescido menos. Ainda vou provar…

  13. "e o IED que não caiu? "

    IED não é a mesma coisa que investimento no sentido macroeconômico do termo. À parte a possibilidade do IED incluir arbitragem de juro disfarçada (muita gente diz, mas eu não sei se a magnitude é relevante), muito do IED refere-se à aquisição de estoque de capital pré-existente.

    Investimento, por outro lado, é adição ao estoque de capital.

  14. Alexandre,

    Adoro seus textos, mas desse eu discordo.

    Não há qualquer evidência de relação sistemática entre taxa de investimento e custo unitário do trabalho. Se isso está ocorrendo neste momento, acredito ser mera coincidência, pois não há qualquer regularidade empírica envolvida entre tais variáveis.

    Com efeito, a variável que parece melhor ter poder explicativo sobre a taxa de investimento é o grau de utilização da capacidade, que está em patamares relativamente baixos neste momento para o caso da economia brasileira.

    Gostaria muito de poder dialogar com você. Caso eu esteja errado, favor me corrigir.

    Att,
    RMB

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