Calda de sereia ou Rabo de sereia? Por Josué Machado

CALDA DE SEREIA ou RABO DE SEREIA?

por Josué Machado

Para obter CALDAS de sereias, será preciso pegar uma ou duas delas e fervê-las durante muitas horas, coitadinhas. De preferência com açúcar, embora se creia que elas já sejam doces. De todo modo, horrível!

A fábrica de brinquedos anunciou com entusiasmo:
Dia das Crianças terá novidades Super Massa e o relançamento do Dr. Opera Tudo com selo comemorativo de 80 anos da Estrela.  
Para crianças que adoram por a mão na massa e criar suas próprias brincadeiras o Super Massa chega com novas temáticas que incluem montar lindas caldas de sereias e até mesmo aprender brincando com as massinhas de números e formas divertidas.”
Pra começar, três enganos do redator, dois deles de grafia e o terceiro de pontuação:
  1. Escreve-se “supermassa” – e não “Super Massa”;
  2. “Pôr”, forma verbal, e “por”, preposição; no contexto do anúncio, claro que se trata de “pôr”, botar a mão na massa.
  3. O anunciante esqueceu a vírgula necessária depois de “brincadeiras”: “Para crianças … suas próprias brincadeiras,(VÍRGULA) o Supermassa…”
Quanto à essência do texto, há um engano involuntariamente engraçado em relação a uma das temáticas anunciadas:
“… com novas temáticas que incluem montar lindas caldas de sereias…”.
Para obter CALDAS de sereias, será preciso pegar uma ou duas delas e fervê-las durante muitas horas, coitadinhas. De preferência com açúcar, embora se creia que elas já sejam doces. De todo modo, horrível!
Porque CALDA é: 1. Solução de açúcar e água fervidos conjuntamente; xarope. 2. Sumo de qualquer fruta fervido com açúcar.
Conclui-se que não fica bem, portanto, produzir CALDA de sereia.
O redator por certo quis se referir a “CAUDA”, o rabo, a extensão posterior das graciosas sereias mitológicas – graciosas pelo menos na parte superior.
Graçolas à parte, basta tomar cuidado com os parônimos – palavras de escrita e pronúncia semelhante, como calda/cauda, o que já vimos antes.
Bom mesmo seria juntar os muitos milhares de políticos, mais os beneficiários das classes favorecidas do judiciário, do ministério público, do executivo e do legislativo que sugam e sugam a seiva e os recursos como nunca antes na história deste país, sem se importar com o empobrecimento geral do povo, e ferver todos bem fervidos durante dias, sem açúcar, mas com ácido sulfúrico, transformando-os em densa CALDA para adubar o deserto do Saara e as zonas desflorestadas do país. Isso, bem agora que preparam nova devastação na Amazônia. (O cheiro da calda resultante seria péssimo, mas nada é perfeito.)
O problema é que caldeirão tão grande, em que coubessem todos eles, só deve haver lá no quinto dos infernos. E não se sabe se Lúcifer estaria disposto a maculá-lo tanto assim de uma só vez.
SEMELHANÇAS ENGANOSAS: ACENTO/ASSENTO; ÁREA (superfície)/ÁRIA (cantiga); BUCHO(estômago)/BUXO (planta); CARDEAL(prelado); CARDIAL (relativo à cárdia, cardíaco); CAÇADO (apanhado na caça)/CASSADO (anulado); CENSO(recenseamento)/SENSO(juízo claro); DESCRIÇÃO(de descrever)/DISCRIÇÃO (de discreto); EMIGRAÇÃO (de emigrar, sair)/IMIGRAÇÃO (de imigrar, entrar); EMINENTE (excelente)/IMINENTE (pendente); FICHAR (anotar)/FIXAR[cs] (firmar); INCIPIENTE (no começo)/INSIPIENTE (ignorante); INTENÇÃO (intento, desejo)/INTENSÃO (intensidade); INVICTO (invencível)/INVITO (constrangido); LAÇO (nó)/LASSO (fatigado); LISO (superfície plana)/LIZO (de lizar, voltar, revolver); MAÇA (clava)/MASSA (mistura de farinha e outras); MORCEGÃO (morcego grande)/MORSEGÃO (beliscão); PAÇO (palácio)/PASSO (marcha); RECREAÇÃO(recreio)/RECRIAÇÃO (de recriar); RUÍDO (rumor)/ROÍDO (de roer, como fazem com os recursos da nação); SEÇÃO (divisão)/SESSÃO (reunião, como aquela, deles); TACHA (prego)/TAXA (imposto, aquilo que nos suga o sangue); VÊS (verbo ver)/VEZ (ocasião); VIAGEM (jornada)/VIAJEM (de viajar); XEQUE (chefe de tribo árabe)/CHEQUE (ordem de pagamento; não se usa mais; agora usam malas pretas).

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JOSUE 2Josué Rodrigues Silva Machado, jornalista, autor de “Manual da Falta de Estilo”, Best Seller, SP, 1995; e “Língua sem Vergonha”, Civilização Brasileira, RJ, 2011, livros de avaliação crítica e análise bem-humorada de textos torturados de jornais, revistas, TV, rádio e publicidade

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