Comentário a Oreiro e de Paula – 1

Quando terminei de ler o artigo de José Luis Oreiro e de Luiz Fernando de Paula (“A Escolha de Sofia?”) no Valor Econômico, à parte minha frustração natural com um texto que, conforme o “O” notou, é uma obra-prima da idiotice fractal, o sentimento que me dominou foi a preguiça: quando chegamos ao ponto de “it’s not even wrong”, eu me pergunto se faria sentido dedicar tempo e trabalho à dissecação das várias barbaridades ali cometidas. Por outro lado, ainda tenho uns dias até as próximas colunas e não muito o que fazer, o que pendeu a balança para estes comentários, além, é claro, dos pedidos de leitores.
O texto se divide essencialmente em duas partes: uma crítica à “visão ortodoxa e uma tese acerca do motivo das altas taxas de juros. Ambas são patéticas: a pretensa “crítica” revela um desconhecimento abissal do que seria a “visão ortodoxa”; já a explicação sobre a razão da elevada taxa de juros demonstra ignorância não menos abissal do bê-a-bá de finanças, além de confundir taxas nominais e reais de juros e, por conseqüência, perder de vista a dinâmica da dívida pública, o que termina de desmontar a tese. 
A suposta crítica à “visão ortodoxa” segue a estratégia comum dos “keynesianos de quermesse”, qual seja, criar um espantalho bem imbecil e bater nele como se estivesse enfrentando um oponente de verdade. Em particular, insistem que os “ortodoxos” pressuporiam “inelasticidade da oferta agregada a longo prazo” e não admitiriam a possibilidade de substituição da poupança interna pela externa.
 “Inelasticidade da oferta a longo prazo”, todavia, é um produto da imaginação dos autores, que pretendem com isso sugerir que a visão oposta não admite alterações do crescimento potencial. Este, contudo, não é uma grandeza gravada em pedra, mas uma variável que se altera com o nível de investimento, crescimento populacional, educação (capital humano) e “produtividade” (um termo deliberadamente vago para capturar, além de progresso técnico estrito, melhorias institucionais, como direitos de propriedade, aprofundamento de mercados,  expansão do crédito, etc). Em outras palavras, a tal “inelasticidade da oferta a longo prazo” não é mais que um espantalho conveniente: “vejam só como são burros estes cara que acreditam que o crescimento potencial é uma constante da natureza”.
Obviamente, a versão alternativa que querem vender é que o crescimento de longo prazo resulta da expansão da demanda agregada, isto é, não há restrição de oferta. A “prova” (risível) é o trabalho do próprio Oreiro em que ele e asseclas regridem o crescimento do PIB no crescimento das exportações, do investimento e do consumo do governo (além da oferta de moeda, M2, deflacionada).
Não vou nem tratar dos problemas econométricos (endogeneidade, por exemplo). No entanto, considerando que, por definição, o PIB inclui exportações, investimento e consumo do governo, a estimação nada mais é do que mais uma pérola do pensamento circular. Eu ficaria admirado caso o estudo (estou sendo generoso) não achasse qualquer relação entre estas variáveis. Na verdade, a única coisa surpreendente aqui é concluir que este achado ampararia a noção que não há restrições de oferta. (Pensando bem, não chega a ser uma surpresa).

24 thoughts on “Comentário a Oreiro e de Paula – 1

  1. Eu já falei. Vou repetir. É Krugman lá e Alex aqui.

    Sério: temos muito a agradecer às pessoas que conhecem o assunto e se dão ao trabalho de demolir as falácias que os picaretas espalham. Isso dito, tenho quase piedade de cientistas como você e o Krugman – sem desmerecer outros – pela quantidade e qualidade das besteiras que os assolam. Não se desvie do bom caminho por conta delas!

  2. Alex,
    um juro real próximo de zero não levaria a uma explosão do preço dos imóveis, com consequências perversas para economia brasileira?(Imagino que os títulos da dívida pública teriam de ser comprados pelo próprio governo,porque os investidores desmontariam suas posições nesses ativos.)

  3. Confesso que morro de medo estudar economia na Unb, pobre anônimo não tem neurônio para acessar o site do curso e observar a pluralidade do departamento com pesquisadores de várias correntes.
    Se levarmos em consideração os incentivos proporcionados pelo Cnpq e Capes que no meu entendimento não são dos melhores, mas até desenvolver algo melhor é o que temos departamento de economia da Unb contempla:
    3 pesquisadores 1A cnpq,
    2 pesquisadores 1B cnpq,
    1 pesquisador 1C cnpq,
    1 pesquisador 1D cnpq
    5 pesquisador 2 cnpq,

    So vejo FGV, PUC RJ, USP com tantos pesquisadores.
    Observa-se que todos os departamentos citados acima tem incentivos financeiros e estrutura para desenvolver pesquisa de fronteira, e a Unb com todos seus problemas podemos considerar que não perde em nada para tais instituições com exceção da FGV-RJ essa sim, acima de todas!

    Saudações

    Anderson

  4. "Confesso que morro de medo de estudar Economia na UnB-Universidade de Brasília."

    Posso garantir que na pós-graduação da UnB os mais sérios nem sabem que é o tal de Oreiro. Os menos sérios já ouviram falar, agora os picaretas …

  5. Alex
    Parabéns!Excelente post!
    Estou me preparando para a Anpec este ano e gostaria de uma ajuda sua.Minha área de maior interesse é Macro.Qual dos centros vc considera o melhor nesta área?
    abraços

  6. Alex,
    Excelente artigo, aprendemos todos os dias um pouco mais, “os visíveis e invisíveis”. Poderia fazer um breve comentário do artigo sobre a confusão entre taxas nominais e reais de juros e, por consequência, perder de vista a dinâmica da dívida pública, o que termina de desmontar a tese.
    Grato
    Charles.

  7. Alex,
    Parabéns pela análise.
    Mesmo sabendo de seu trade-off para tecer outra análise de mesmo nível, gostaria de ver comentários seus sobre os demais artigos publicados na série do Valor.
    Caso seja possível, seria enriquecedor para nós leitores.
    Sugiro um de largada: Marcio Holland !
    Abraços e obrigado.

  8. Bom, anônimo das 17.18 Isso de pesquisador do CNPq não quer dizer muito. Oreiro é pesquisador 1A. Com esse critério Oreiro faz parte da elite dos pesquisadores em economia e (eu acho, Alex me corrige), o Alex não é pesquisador. Escolha outro critério para defender o Departamento de Economia da UnB.

  9. "gostaria de ver comentários seus sobre os demais artigos publicados na série do Valor."

    Agora preciso entregar os artigos da Folha e do Valor, mas, sobrando tempo, volto ao assunto.

  10. Se acharmos que uma universidade é ruim porque a opinião de um professor é bizarra, devemos fechar todas as universidades brasileiras. O Oreiro não representa a UnB, aliás, numa universidade pública, em que se tem uma pluralidade de formas de pensar muito maior do que numa privada, não há professores que representem o departamento.

    Fiz boa parte daminha graduação na FEA-USP e transferi recentemente pra UnB. Ambas tem excelentes cursos de economia, com ótimos professores e alguns ruins também. Não é só porque você discorda da visão heterodoxa que você deve desqualificar uma universidade que tem um professor heterodoxo. Acho inclusive importante conhecer a teoria da qual você discorda pra poder fazer uma crítica, não simplesmente chamar os que pensam de modo diferente de bando de burros.

    Parabéns pelos textos Alex, é no debate, e não na desqualificação, que as pessoas aprendem.

  11. Prezados,

    Pesquisadores nível 1A do cnpq, do departamento de economia da Unb são
    Joaquim Andrade
    Joanílio Teixeira
    Maria da Conceição

    abraço

    a todos

  12. Perfeito. Desconstrução de dois macunaímas intelectuais dos mais deletérios.

    Agora, e a culpa do maior jornal de economia do país?

    Refaço a pergunta (respostas, Alex e O?): para que serve a editoria de um opinião de um jornal? Qual é o papel de um editor? Deve publicar qualquer porcaria? Ou, caso não entenda que tratar-se de um bolo de cocô (e de autores que pratiquem a coprofagia), o Valor deveria querer um editor apedeuta?

    PS.: A propósito: Fernando Ferrari e Mondonezzis strike back na edição de hoje.

  13. Estudei economia na unb e o departamento é bem "eclético".
    Tem professores mais e menos ortodoxos e até uns dois comunas, dá para focar na área de seu interesse.
    O departameno é muito bom, não precisa ter medo. Agora, quanto aos malucos pseudo-comunistas da universidade é outro assunto!

    henrique

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