Mais infinda que o infinito. Coluna Carlos Brickmann

MAIS INFINDA QUE O INFINITO

COLUNA CARLOS BRICKMANN

 

EDIÇÃO DOS JORNAIS DE DOMINGO, 7 DE JANEIRO DE 2018
Nelson Marchezan Jr., PSDB, prefeito de Porto Alegre, sem consultar o governador gaúcho Ivo Sartori, MDB, pediu ao Governo federal que mande o Exército e a Força Nacional para manter a ordem na cidade, no dia 24, quando o apelo de Lula contra a sentença que o condenou a 9,5 anos de prisão será julgado pelo Tribunal Regional Federal. Conforme a decisão, o ex-presidente pode ficar inelegível pela Lei da Ficha Limpa e ser até preso.
A situação de Lula deixou o PT ultra-inquieto: o partido programou até a ocupação de Porto Alegre, líderes como José Dirceu pregam algo muito parecido com insurreição e guerra civil. Bobagem: se alguém ultrapassar os limites pode ser preso. E o PT tem um problema sério: sem o poder, com a Lava Jato, sem imposto sindical, como pagar os voluntários, transportá-los e alimentá-los? O partido se arrisca a um fiasco como o da última caravana.
Aí entra Nelson Marchezan Jr., ultrapassando os limites de ser prefeito e dando à manifestação petista, que não era muito diferente de demonstração de intenções, o caráter de coisa séria. Considera-se ameaçado, o prefeito! E pede gente fardada para protegê-lo das hordas vermelhas, que imagina que existam e que queiram ocupar sua cidade. Marchezan virou a esperança dos petistas radicais, ao dar-lhes crédito e visibilidade, como se força tivessem.
Frase de Einstein: “Duas coisas são infinitas, o Universo e a estupidez humana. Mas, com relação ao Universo, ainda não tenho certeza absoluta”.
 …ói ele aí tra veiz
José Rainha, que foi líder do MST, perdeu o posto para Stedile e estava silencioso, foi convocado para ajudar a ocupar Porto Alegre (afinal de contas, é um a mais). Rainha diz que este será um “janeiro quente” e que todos devem se mobilizar em defesa de Lula. Há pouco mais de dois anos, Rainha foi condenado a 31 anos de prisão, mas não foi preso até agora.
 Dois destinos
Lula em Porto Alegre, tentando reverter a condenação que sofreu em Curitiba, com risco de ser preso ou declarado inelegível; Temer, na mesma data, 24 de janeiro, a caminho de Davos, na Suíça, para participar do Fórum Econômico Mundial, levando os ótimos resultados que a economia brasileira vem apresentando. Com ele, os dois principais executivos da área econômica: o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, e o presidente do Banco Central, Ilan Goldfajn. São bons resultados; e, se houver medidas de apoio – por exemplo, a volta do grau de investimento, perdido por Dilma – Temer pode até sonhar em ganhar popularidade e ser candidato à reeleição.
 Desafio maior
A tropa de choque oposicionista nas redes sociais (e jornais) tem um problema sério para negar que os dados econômicos tenham melhorado. É que Meirelles foi repetidamente indicado por Lula a Dilma para ocupar o Ministério da Fazenda; e Dilma seguidamente o rejeitou. Lula tinha razão.
Martelo…
o mesmo tempo em que escolheu gente do ramo para tocar a economia e deixa seu pessoal trabalhar, Temer continua devastando a administração com apetite de gafanhoto faminto. A escolha de Cristiane Brasil, filha de Roberto Jefferson, para o Ministério do Trabalho, é um exemplo notável: Cristiane é citada na delação da JBS (por estar entre os negociantes de um pixuleco de R$ 20 milhões para o seu PTB, em troca do apoio do partido à candidatura de Aécio Neves, do PSDB, em 2014). É apontada na delação da Odebrecht como receptora de uma bonita mochila com R$ 200 mil. Há mais: dois funcionários a processaram na Justiça do Trabalho pedindo indenização por horas extras não-remuneradas. Ambos ganharam.
 …na ferradura
Por falar em “ambos”, Moreira Franco e Eliseu Padilha, ambos ministros, estão ambos na mira da Lava Jato – ai de ambos se perderem o cargo e o foro privilegiado! Temer tem encontro com a Justiça de primeiro grau assim que deixar o mandato (por isso é importante para ele poder tentar a reeleição). Solitário num escândalo antigo, o ministro das Cidades, Alexandre Baldy, era chamado por Carlinhos Cachoeira de “menino de ouro”. Cachoeira não é de distribuir elogios a quem não os mereça.
 Tesouro detonado
Foi bonita a festa, pá, como disse Chico Buarque sobre outro assunto. O Rio teve fogos durante 17 minutos seguidos, um recorde. Mas a conta veio logo: os dois principais hospitais universitários do Rio ficaram sem verbas e ameaçam suspender a contratação de residentes – o que é pior do que parece, por prejudicar o atendimento dos pacientes e o treinamento dos médicos. As escolas de samba, habituadas a fartos cofres, ajustam em cima da hora seus desfiles, para que não lhes falte dinheiro no Sambódromo. Que ninguém diga que este é um problema do Rio: o Carnaval carioca é o grande símbolo do turismo brasileiro, e o Rio é o cartão de visitas do país.

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3 thoughts on “Mais infinda que o infinito. Coluna Carlos Brickmann

  1. Sobre Gabinetes, Plenários, Siglas Partidárias e Outras Siglas

    – Siglas, nada mais do que siglas, meu neto. Cada “debate”, burburinhos negociando vantagens imediatas e futuras. Uma grande maioria conjugando o mesmo verbo em relação ao dinheiro arrecadado pelos cofres públicos. Quem não faz parte da grande maioria é um reles estranho no ninho. E os honestos pagadores de impostos, só… ops, não posso pronunciar tal indecorosa expressão, meu neto…
    – Vovô, deixa disso… pode falar! Só top top, né mesmo? Mas, até quando o Brasil será assim?
    – Se um dia você souber a resposta à essa sua pergunta, querido neto, não deixe de responder ao seu futuro netinho…

  2. Como diria Seinfeld, “notes about nothing”:
    Einstein: “Duas coisas são infinitas, o Universo e a estupidez humana. Mas, com relação ao Universo, ainda não tenho certeza absoluta”. Einstein provavelmente nunca leu o escritor Robert Heinlein, seu contemporâneo, cujo dito espirituoso presente num de seus livros (“Você atribuiu condições à vilania que podem ser simplesmente resultados da estupidez”) se tornaria depois, ligeiramente modificado, mais conhecido como “navalha de Hanlon” (nome de um sujeito que ninguém sabe ao certo quem era): “nunca atribua à maldade o que pode ser mais adequadamente explicado pela estupidez”. De fato, desde Napoleão Bonaparte (que teria supostamente dito, certa vez: “nunca atribua à maldade o que já está explicado pela incompetência”), frases desse tipo têm sido registradas aqui e ali. São várias, e todas, a meu ver, injustas. A estupidez não é, digamos, ” humana”. Humanos até cometem atos estúpidos às vezes, mas, na maioria delas, a seus próprios olhos, seus erros acabam se revelando erros. Ou seja, compreendem-no como tal, e raramente o repetem – ou ao menos não o repetem amiúde. E, quando o repetem, se o fazem, já não se trata de estupidez, mas, ao contrário, neste caso, de maldade, já que provavelmente há algo a ganhar com ela. Portanto, tal estúpido nada tem de estúpido, mas, isto sim, de esperto… O estúpido, no entanto (se o entendermos no sentido psicométrico do termo), quase nunca reconhece o erro que comete, e, por isso, comete a mesma estupidez repetidamente, sendo necessária, pois, muuuuita didática para convencê-lo do quão errado é seu erro. Medicação até ajuda nesses casos, mas raramente com resultados animadores. A estupidez, por isso mesmo, não é exatamente humana, dado o sentido generalizante do termo, embora acometa humanos com certa regularidade, dando-lhes, pois, a oportunidade de aprender e não repetir, coisa que felizmente ocorre na imensa maioria das vezes. A estupidez, em sua concretude, vale reforçar, é propriedade do estúpido, e nem todos os homens são estúpidos – ainda que, diante de uma turma deles (fato comum, pois que habitualmente se juntam), seja difícil acreditar nisso. Sobre o caso particular de Nelson Marchezan Jr., por razões de ética profissional, nada comentarei. Quero, no entanto, para encerrar este modesto comentário, salientar algo aparentemente invisível, embora grandemente estudado pela História da Ciência: a substituição da vilania (em Heinlein) ou da maldade (em Hanlon) pela estupidez revela um vício subjacente: a substituição da moral pela psicologia, ou, noutros termos, da fé pelo conhecimento. Parece que, ao longo de nossa história (aqui, sim, humana), aprendemos a tornar o mundo mais prático, diagnosticável e corrigível, ao nos distanciarmos dos templos de oração para nos aproximarmos dos laboratórios de experimentos. Noutras palavras, parece-nos mais fácil entender e corrigir o estúpido episódico do que identificar e punir o mau – que, por mau que seja, nunca será episódico… Deus e o Diabo é que podem explicar melhor esse caso. Quanto a nós, resta saber se realmente é mais fácil sofrer com a estupidez alheia do que com sua maldade.

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