Vamos trocar de sobrenome. Coluna Carlos Brickmann

VAMOS TROCAR DE SOBRENOME

COLUNA CARLOS BRICKMANN

 

EDIÇÃO DOS JORNAIS DE DOMINGO, 4 DE FEVEREIRO  DE 2018
Um grande artista, Vicente Leporace (de Franca, como este colunista), assinava seu programa na Rádio Bandeirantes como “Vicente Leporace Furtado”. Achava com razão que todo brasileiro deveria usar o sobrenome.
Uma queixa comum contra as tímidas tentativas de reformas é que, se gastássemos menos com os políticos, haveria dinheiro para aposentadorias, saúde, educação, segurança. Não é bem assim: o rombo é mais em cima. Mas dói saber que, enquanto Estados atrasam o salário dos funcionários, enquanto não há dinheiro para manter os hospitais em boas condições de uso, enquanto faltam verbas para equipar direito a Polícia, há juízes – que têm vencimentos próximos de R$ 30 mil mensais – que dão um jeito de receber até mais de R$ 100 mil, fora carro e motoristas; que todos os parlamentares federais multiplicam seus salários com penduricalhos vários, incluindo assessores que lhes prestam serviços privados; que o presidente da República tem um palácio para trabalhar, o Planalto, dois para morar, o Alvorada e a Granja do Torto, e habita um terceiro, o Jaburu. Cortar essas despesas inúteis não resolve os problemas nacionais. Mas dá o exemplo: que sente um cidadão ao ver que um juiz, já bem pago, com vencimentos superiores ao teto constitucional, briga para ganhar auxílio-moradia em dobro, considerando que sua mulher já o recebe? Com que moral vai ficar?
Assinado, Carlos Brickmann Furtado

 

Gastando em anúncios
O Governo não dá o exemplo, os parlamentares não dão o exemplo, o Judiciário não dá o exemplo, e a solução encontrada para convencer a população a apoiar reformas é gastar mais dinheiro em propaganda. Como esta, baseada na excelente campanha publicitária dos postos Ipiranga:
Mulher: “Amigo, sabe onde eu encontro gente se aposentando com salário de 30 mil reais?
Homem: Uai, é lá no Posto da Previdência.
Mulher: E onde eu encontro aposentado com 50 anos?
Homem: Posto da Previdência.
Mulher: E onde eu encontro muita gente trabalhando muito para pagar esses privilégios de poucos?
Homem: Posto da Previdência.
Mulher: E onde eu encontro uma Previdência justa, com todos trabalhando igual e recebendo igual?
Homem: Ah, aí é só com a reforma da Previdência, uai!”
O caro leitor se convence com este anúncio? Mesmo tendo lido na coluna anterior, do dia 31 de janeiro, que um técnico em Administração do Tribunal de Justiça da Bahia se aposentou com quase R$ 50 mil mensais?
O gato comeu
Quando Brasília foi construída, não havia muitas moradias disponíveis. A Câmara e o Senado resolveram, então, criar as moradias funcionais, para parlamentares. Isso aconteceu no início da década de 1960. Hoje, 58 anos depois, Brasília tem residências para todos, tem hotéis de todas as categorias, mas as moradias funcionais não só continuam existindo como se espalharam pela estrutura administrativa, apesar da despesa que geram, em custos diretos e manutenção.
É daquelas pragas que sempre sobrevivem, como dar aos parlamentares uma cota de selos. Hoje, quem precisa disso?
Onde está o dinheiro
O auxílio-moradia para juízes surgiu para os que são transferidos de cidade e ficam sem ter onde morar. Aí surgiram as reivindicações, houve as liminares, e hoje o juiz que trabalha na sua comarca, mesmo que tenha uma bela casa ao lado do Fórum, recebe R$ 4.253,00 (se o cônjuge for juiz, a ajuda vem em dobro, embora morem na mesma casa). Segundo a ONG Contas Abertas, essas liminares já custaram ao país uns R$ 4,5 bilhões.
Dois destinos
Outro lugar-comum: se os ladrões devolvessem o que roubaram, sobraria dinheiro. Talvez não sobrasse, mas ajudaria. Só que a Lava Jato conseguiu a condenação, em Curitiba, de 140 réus. Já no Supremo nenhum julgamento foi concluído. A turma do foro privilegiado deve ter mais a devolver. Até agora todos escaparam e seu dinheiro também. Aí fazem anúncios para convencer o cidadão honesto a aceitar aposentadoria menor.
Um caminho
Nem juízes nem parlamentares são obrigados a receber ajudas. Mas dos 513 deputados, só 26 renunciaram aos penduricalhos. Os juízes lutam pela ajuda, organizadamente: a Ajufe, Associação dos Juízes Federais, está mobilizada. É provável que a questão seja julgada no STF em março.
Fato é fato
A feroz artilharia da falsificação de notícias não admite que não havia reunião da FAO marcada para janeiro, em Adis Abeba, Etiópia, e à qual Lula teria sido convidado. É só conferir o site oficial da FAO: http://www.fao.org/brasil/noticias/detail-events/en/c/1099176/ O que aconteceu foi uma reunião entre a ONU e a União Africana, na qual havia também funcionários ligados à FAO. O tema era o combate à corrupção. Convidar Lula citando a FAO era mais palatável.
 Dúvida
Amanhã, atenção em Curitiba: o juiz Sérgio Moro interroga os empreiteiros que pagaram a reforma do sítio de Atibaia que não é de Lula.

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1 thought on “Vamos trocar de sobrenome. Coluna Carlos Brickmann

  1. Convidar Lula a evento sobre ‘Combate à Corrupção’ seria realmente o máximo. Dá pra imaginar um curso de extensão universitária sobre métodos e técnicas. Valendo créditos! Nosso líder popular, o professor de todas as disciplinas, seria acompanhado de comitiva acadêmica composta por metade do PT, metade do PMDB, Palocci, Roberto Jefferson, Geddel, Jucá e metade do que sobrar no mundo político brasileiro, de vereador pra cima. Chegar à Etiópia seria coisa para umas centenas de Antonovs lotados até a tampa. Temer, convidado especial que proferiria aula inaugural sobre malas, apartamentos-esconderijo e montanhas de dinheiro público para compra de parlamentares, seria o homenageado especial do evento. Condecorado como ‘O Bandidão Público Mais Atuante de 2017’, ele receberia a medalha de ouro maciço diretamente das mãos de Rocha Loures, que a traria numa mala. Convidado então pela União Africana para assumir a reitoria da recém-criada Universidade do Combate à Corrupção, ele de pronto aceitaria, desde que o posto, claro, valesse foro privilegiado.
    (Os pilotos dos Antonovs, que nada têm a ver com essa turma, voariam em cabines blindadas, para que os honrados passageiros não lhes roubassem carteiras, calças e sapatos.)

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