Sempre na contramão da história. Por Celso Barata

SEMPRE NA CONTRAMÃO DA HISTÓRIA

Por Celso Barata

Enquanto isso, em Pindorama, faltando apenas cem dias para o pleito, não se ouvem propostas, nem ideias, planos, nomes, seja lá o que for…

PUBLICADO ORIGINALMENTE EM O GLOBO, EDIÇÃO DE 15 DE JUNHO DE 2018

Em apenas uma mesma semana, duas notícias se entrelaçam e confirmam nova tendência inusitada de políticos internacionais, que se contrapõe frontalmente ao estranho comportamento de alguns de nossos candidatos.

Segundo a CNN, o ex-presidente Obama já se reuniu com nada menos que oito possíveis candidatos democratas — atitude inédita na política americana, onde os ex-mandatários normalmente se afastam de vez do dia a dia político após deixarem o mandato.

Na Espanha, o prestigioso jornal “El País” reporta que o novo primeiro-ministro socialista Pedro Sánchez não formou seu governo em apenas dois dias como se poderia erroneamente deduzir: ao contrário, há mais de um ano, logo após recapturar surpreendentemente nas primárias o comando do Partido Socialista Operário Espanhol (cargo que abandonara pouco antes), ele vinha se reunindo sistematicamente, toda segunda-feira, num discreto hotel ou em um mesmo restaurante madrilenho com dezenas de personalidades influentes da cultura, das artes, das ciências, do esporte e até da política etc. em busca de sugestões de nomes de futuros ministros.

Em geral, pedia nomes de mulheres — o que acabou provocando seu inédito governo de maioria de dois terços feminino contra apenas um terço masculino.

O PT não se mexe, estático, para não destruir a ilusão de uma possibilidade. No PSDB, o ex-governador Geraldo Alckmin se recusa a se mover, alegando não querer ferir suscetibilidades. E já há até piada nas redes sociais de que a ex-senadora Marina Silva seria um estranho animal que aparece somente de quatro em quatro anos, para submergir logo em seguida, em profundo mistério.

Esses dois exemplos de estratégias de longo prazo se casam também com o recente exemplo de Emmanuel Macron, que deixou o ministério da Economia de François Hollande, na França, para esquadrinhar o país afora buscando indicações do humor e das queixas do eleitorado, até surgir como candidato independente e botar no bolso os dois maiores partidos, da direita e da esquerda, elegendo-se de lavada. Até que o caso Macron já tem servido de exemplo de marketing para consultores políticos tupiniquins, que já defenderam essa original estratégia de ouvir profundamente o eleitorado, sem sucesso aparente.

Enquanto isso, porém, em berço esplêndido, alguns de nossos candidatos são recriminados todo dia pela imprensa e correligionários exatamente por não moverem uma palha, à espera — quem sabe — que se resolva a situação da suposta candidatura favorita, do ex-presidente Lula. O PT não se mexe, estático, para não destruir a ilusão de uma possibilidade. No PSDB, o ex-governador Geraldo Alckmin se recusa a se mover, alegando não querer ferir suscetibilidades. E já há até piada nas redes sociais de que a ex-senadora Marina Silva seria um estranho animal que aparece somente de quatro em quatro anos, para submergir logo em seguida, em profundo mistério.

Os exemplos de Macron, Sánchez e Obama são total e curiosamente inéditos, mostrando quem sabe um novo aprofundamento da maneira de fazer política. Quando é que um ex-presidente dos EUA assumiu a difícil tarefa de reestruturar um partido? Só o então ex-vice-presidente Richard Nixon, que tinha jurado aos jornalistas sumir da política de vez, é que, após duas derrotas sucessivas — para presidente e depois para governador da Califórnia (em 1960 e 62) —, retornou triunfante (e vitorioso) do ostracismo em 1968.

Mas quando é que se soube de alguém formar ministério durante um ano de tão amplas pesquisas? Quando um político correu um país como a França de cima a baixo ouvindo pessoas comuns?

Enquanto isso, em Pindorama, faltando apenas cem dias para o pleito, não se ouvem propostas, nem ideias, planos, nomes — seja lá o que for. Estranho país, sempre na contramão da história.

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celso barataCelso Barata – é jornalista. Foi editor  de Política Internacional. Trabalhou e colabora com alguns dos mais importantes veículos nacionais.

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