Tecnologia antes da Cultura. Por Meraldo Zisman. Especial ELEIÇÕES 2018

Tecnologia antes da Cultura

MERALDO ZISMAN

ELEIÇÕES   2018

Resumindo, somando-se os totalmente analfabetos aos analfabetos funcionais (autodeclarados), há no Brasil 45 milhões de eleitores abaixo do nível da escolaridade primária…

Segundo pesquisas do Ministério da Educação, há no Brasil 16 milhões de analfabetos, pessoas que não conseguem sequer escrever um bilhete. Já os que não chegaram a concluir a 4ª série do ensino fundamental somam 33 milhões, 50% dos quais concentrados no norte e nordeste do País. Apesar de concordar com a ideia de que o processo democrático é algo dinâmico e em constante aperfeiçoamento, enquanto os regimes totalitários são estáticos e donos de uma verdade imposta, acredito no que ensina o sociólogo alemão Max Weber (1864-1920):

“A Democracia é a melhor forma de governo, porém possui o seu calcanhar de Aquiles. É o seu ‘colégio eleitoral’ aqui entendido como um órgão formado por um conjunto de eleitores com o poder de um corpo deliberativo, que elege alguém a um determinado posto”.

As estatísticas oficiais mostram como a categoria dos eleitores com baixa ou nenhuma escolaridade podem ser mais facilmente manipulados.

No ano de 2000, 16.294.889 brasileiros declaravam-se analfabetos, sendo esse número reduzido para 13.933.173 em 2010. Desse total, 39,2% dos analfabetos eram idosos. O IBGE identificou que a maior proporção de pessoas analfabetas se encontrava nos municípios com até 50 mil habitantes na região Nordeste do país. Segundo pesquisas do Ministério da Educação, no Brasil há 16 milhões de analfabetos.

Resumindo, somando-se os totalmente analfabetos aos analfabetos funcionais (autodeclarados), há no Brasil 45 milhões de eleitores abaixo do nível da escolaridade primária…

Entre 1881 e 1985 todas as tentativas de acabar com os iletrados naufragaram, assim como sua participação em eleições..

Conferir a posição do Rui Barbosa quanto a não permitir os iletrados de votar: (ttps://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/71268/000879095.pdf?sequence=1).

Até 1985, quando foi promulgada a Emenda Constitucional nº 25 à Constituição de 1967, os analfabetos não tinham o direito de votar, vivendo à margem da democracia. Nas Eleições Municipais de 2016, a mais recente antes da atual, um total de 38.287.816 eleitores analfabetos estavam habilitados a votar. Destes, 43,83% se abstiveram, ou seja, 16.784.784 eleitores.  

…Que importa se a urna é eletrônica, inviolável ou não, se a maior parcela dos eleitores não têm escola para aprender ou se esclarecer. E passa até fome…

A primeira mudança que o voto do analfabeto trouxe para o sistema eleitoral foi o advento do uso de números para identificar os candidatos, no lugar do nome por extenso que devia ser escrito na cédula eleitoral. Isso se deve ao fato de que é mais fácil para uma pessoa iletrada decorar uma sequência de números do que letras, o que preserva a integridade e autonomia do seu voto. A identificação de candidatos e partidos por numerais acabou por servir de base para o advento do sistema da urna eletrônica, que é utilizada no Brasil desde 1996.

Nas eleições brasileiras de 2018 as Fake News (notícias falsas) divulgadas pelas redes sociais influenciaram os eleitores, suplantando as mídias tradicionais: rádio, televisão e a mídia impressa.

Quando vejo a dúvida quanto à inviolabilidade das urnas eletrônicas lembraria: Sem Educação e Ensino não haverá tecnologia que seja capaz de fazer avançar a Democracia Brasileira. Ficamos no mesmo coronelismo, agora apenas camuflado. Que importa se a urna é eletrônica, inviolável ou não, se a maior parcela dos eleitores não têm escola para aprender ou se esclarecer. E passa até fome…

A cabeça do votante continua desinformada e agora mais confusa, o que leva a desavenças entre amigos e familiares. É o que assisto.

Para concluir, vou revelar uma coisa (sem saudosismo piegas). No tempo dos coronéis era tudo mais simples e havia um folclore mais engraçado. Costumo dizer: sem humor, do que vale viver? Havia todo um folclore cujo centro era, na maioria das vezes, o chefe político ou o dito coronel. O voto era passado das mãos do coronel para o eleitor em cédula dobrada e quando o pobre do eleitor queria ver o nome em quem ia votar, o chefe, o capataz ou o cabo eleitoral ou qualquer coisa que o valha gritava: “Pra que olhar primeiro se você nem sabe ler? E depois o voto é secreto. Você não sabe disso? Seu idiota! Quer ir pro xilindró? Olha o meganha!” (“MEGANHA”, origina-se da gíria “ME GANHA”, dita por fora-da-lei, no sentido desse mesmo alguém ser preso. Com o tempo, a frase foi recombinada e passou significar qualquer membro da polícia militar, fardado e, consequentemente, armado, com “ares” de violento ou intolerante (ou ambos), “ … que vem aí para te prender…”

Ao estarmos próximos do segundo turno das eleições de 2018 é bom lembrar que, apesar de todos os esforços, estratégias e ações para a superação do analfabetismo, entramos neste século XXI com duas vezes mais analfabetos do que tínhamos há 140 anos, quando cassaram o direito dos iletrados de votar (Lei 3.029, de 09 de janeiro de 1881, Lei Saraiva).

O objetivo da exigência de saber ler e escrever para ser eleitor não era limpar as urnas, mas sim impedir o alargamento da participação popular. Ou talvez para que o voto levasse a escolhas mais conscientes e – quiçás – mais produtivas, em termos políticos.

A exclusão dos analfabetos do direito de voto por mais de um século parece que não surtiu grandes efeitos e não me venham dizer que a culpa é da Fake-News & Cia.

Afirmo: Quando a tecnologia precede a cultura, o progresso e o desenvolvimento, o resultado é que a nossa população foi polarizada, como nunca. Não sei se com tal polarização o chamado Estado Democrático do Direito sobreviverá, após estas eleições.   


Meraldo Zisman Médico, psicoterapeuta. É um dos primeiros neonatologistas brasileiros. Consultante Honorário da Universidade de Oxford (Grã-Bretanha). Vive no Recife (PE).

 

 

 

1 thought on “Tecnologia antes da Cultura. Por Meraldo Zisman. Especial ELEIÇÕES 2018

  1. BRILHANTE, DR. MERALDO! SUA VISÃO DE CIDADÃO BRASILEIRO É AMPLA, DE FORA PARA DENTRO E DE DENTRO PARA FORA, ALARGADA, AINDA MAIS, PELO RESPALDO PSICOTEARAPÊUTICO E ANTROPOLÓGICO QUE POSSUI.
    PARABÉNS.

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