Mito, logo existo. Coluna Carlos Brickmann

MITO, LOGO EXISTO

COLUNA CARLOS BRICKMANN

Resultado de imagem para titãs, grecia

EDIÇÃO DOS JORNAIS DE DOMINGO, 4 DE AGOSTO DE 2019

A riquíssima mitologia grega abrigava deuses, semideuses, titãs – estes se tornaram tão poderosos que ensaiaram uma rebelião contra os deuses. Os atuais estudos arqueológicos revelaram uma nova categoria de mitos: os Tantãs. Os Tantãs eram mais poderosos que os Titãs. Sua afiada língua, comprida e venenosa, infundia temor. Mas tinham uma compulsão que os enfraquecia: quando tudo dava certo, queriam imediatamente melar o jogo.

O reino dos Tantãs, assolado há muitos anos por sedentos inimigos que se achavam os únicos deuses, foi retomado; tudo parecia conspirar para que, fosse bom ou mau o governo Tantã, a recuperação fosse rápida. Velhos parasitas perceberam que ou reduziam sua gula ou logo não haveria nada mais para sugar. O Grande Conselho do Ócio despertou, imagine!, com vontade de trabalhar. Os deuses supremos mostraram-se gentis. E foi então que a língua comprida dos Tantãs machucou os Grandes Conselheiros e os deuses supremos. O Alto Comando Tantã aproveitou para fazer desfeita ao chanceler de um país amigo com o qual o reino dos Tantãs fazia bons negócios. E, numa daquelas conversas sem compromisso, jogaram também contra eles a numerosa e influente classe dos Homens da Lei.

Justiça seja feita: não havia na Grécia pontaria melhor que a dos Tantãs. E as usaram com precisão tamanha que nunca erraram um tiro no próprio pé. Como o herói Aquiles, seu ponto frágil foi o calcanhar.

O fim da história

Deuses, semideuses, heróis, titãs, todos acabaram dando nome a lugares e eventos, perdendo importância, transformando-se em mitos.  E os Tantãs, que se colocaram como mitos antes de iniciar sua trajetória? Os arqueólogos não chegaram ainda ao fim da história: os manuscritos estão sendo organizados. É difícil: imagine um texto do filósofo Olavóstenes, em grego antigo, lido pela intelectual adversária Dilmápsia. Um dia se saberá.

Briga boba 1

O presidente Bolsonaro não gosta do presidente nacional da OAB, Felipe Santa Cruz; e, ao que tudo indica, Santa Cruz também não gosta dele. Jogo jogado. Mas Bolsonaro, numa conversa de barbeiro, desandou a falar sobre o pai de Santa Cruz, preso e morto por agentes da ditadura militar, em 1974. À época, Bolsonaro tinha menos de dois anos de idade. Não tinha nada com isso, não sabia, não tinha como saber – mas disse que a morte não foi causada por agentes da ditadura.

Bobagem: Fernando Augusto Santa Cruz de Oliveira foi preso e recolhido pelo CISA, Centro de Informações da Aeronáutica, e disso há registro oficial. Mas não há registro da liberação. Veja em http://www.chumbogordo.com.br/26958-a-morte-e-a-morte-de-fernando-por-jose-paulo-cavalcanti-filho/ a história como ela foi, contada por quem investigou o tema e é um dos mais conceituados advogados brasileiros.

Briga boba 2

Mas, tanto quanto os documentos, vale o desabafo do delegado aposentado Cláudio Guerra, que dirigia o Dops na época. “Como não foi assassinado? Eu é que joguei ele no forno!” O forno a que se refere Guerra é o da usina Cambahyba, em Campos, RJ, muito usado para isso na época.

O Ministério Público Federal denunciou o delegado Guerra por ocultação de cadáver. É difícil que o caso vá em frente: está prescrito e há a anistia.

Briga boba 3

Bolsonaro disse que, se o presidente da OAB quiser saber, ele lhe conta como seu pai foi morto. Em outro momento, disse que Santa Cruz foi morto por militantes esquerdistas em desavenças internas. O problema é que, por lei, se sabe algo a respeito de um crime, tem obrigação de comunicar. Não vai acontecer nada, mas é mais uma chateação por falar sem pensar.

Fora de hora

Bolsonaro criou essa nova discussão (além de ter desmarcado encontro com o chanceler francês, porque ele já tinha conversado com ambientalistas) num momento em que deveria apenas estar festejando: a taxa de juros Selic é baixa, vai baixar mais, o texto da reforma tributária deve ir ao Congresso em outubro, a Petrobras teve lucro recorde no trimestre e, eventualmente, a alta das tarifas de importação imposta pelos EUA à China (que deverá gerar retaliação) pode beneficiar as exportações brasileiras para ambos os países.

Mais: de acordo com pesquisa do Congresso Data Room, 41% dos cidadãos acham que o Brasil caminha na direção correta, 36% acham ótimo ou bom o governo Bolsonaro (contra 31% de ruim e péssimo), e aproximadamente um terço do eleitorado o aprova (32%), 34% o desaprova e 34% não opinam. A cereja: apesar dos hackers, o prestígio de Sérgio Moro está inabalado.

Boa, mas nem tanto

O lucro da Petrobras foi excelente considerando-se a receita da venda da TAG, de transporte de gás. Sem a TAG, foi 33% menor que o esperando. Foi de pouco mais da metade do lucro obtido no mesmo trimestre de 2018.

________________________________________________________

CURTA NOSSA PÁGINA NO FACEBOOK

COMPARTILHE

ASSINE A NEWSLETTER NO SITE CHUMBO GORDO (WWW.CHUMBOGORDO.COM.BR)

___________________________________________________

COMENTE:

carlos@brickmann.com.br
Twitter: @CarlosBrickmann
www.brickmann.com.br

 

3 thoughts on “Mito, logo existo. Coluna Carlos Brickmann

  1. Sugestão de leitura: “Como morrem os mitos”, de Lévi-Strauss, no livro-coletânea Antropologia Estrutural II. Lá, pode-se ler que um mito totêmico não morre, exatamente, mas pode se transformar noutra coisa, noutro mito, conforme vai migrando de uma região geográfica para outra. Como essa transformação pode ser radical, o mito perdendo assim seu núcleo significativo, pode-se encarar isso como um tipo de morte. Resta saber, no caso do capitão mor, a que região o cara migrará (pra fora da política, por exemplo…), qual o conteúdo que se desintegrará, e que nova forma assumirá. Só uma coisa é certa: um dia, morre, tal como é hoje. É inevitável. Aos mais pacientes, resta aguardar enquanto sofrem com a estupidez do bronco. Aos outros, que tal começar a trabalhar na remoção desde já? “Como enterrar os mitos” pode ser um novo e mais alvissareiro capítulo de nossa história…

  2. Briga boba 1: assim como Felipe Santa Cruz, também não gosto de Bolsonaro. O pai de Felipe foi assassinado em 1974, sim. Mas Bolsonaro, que nasceu em 1955, tinha bem mais de 2 anos nessa época – o que não invalida a barbaridade dita por ele.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Assine a nossa newsletter