Quem avisa nem sempre é amigo. Por Edmilson Siqueira

QUEM AVISA NEM SEMPRE É AMIGO

EDMILSON SIQUEIRA

… Foi assim com Collor. Pode ser assim com Bolsonaro? Talvez. Ontem (sábado, 2 de novembro, coincidentemente Dia de Finados), Collor declarou em entrevista que esse filme (o do governo atual) ele já assistiu. E assistiu mesmo. Há semelhanças notórias entre o deserto político de Collor e o abandono gradual de aliados de Bolsonaro…

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Quem viveu os dois anos e nove meses em que Fernando Collor de Mello governou o Brasil sabe o horror que foi. Dois dias antes da posse, todas as contas nos bancos passaram a ter apenas 50 cruzeiros (acho que era esse o nome da moeda). Dava pra comprar uns quatro maços de cigarros, acho eu. Desespero geral, gente querendo se matar e outros querendo matar o presidente (eu conheci pessoalmente um caso que, claro, não foi em frente).

Depois, foi aquele inferno: a economia voltando aos poucos a ser o que era antes por falta de base monetária, a corrupção correndo solta (nada igual ao PT, mas notória) e total ausência de credibilidade numa estranha ministra da Economia que teve uma aventura com um conhecido paquerador e senador amazonense em Paris (ele a abandonou lá, dizendo que ia comprar cigarros) e, depois, se casou com o colecionar de pensões para ex-mulheres e genial humorista, diga-se, Chico Anísio. De economia mesmo, entendia quase tanto quanto Itamar Franco.

O fracasso do tal plano fez Collor patinar no poder. Sem um partido forte a sustentá-lo, procurou nomes no Congresso para buscar maioria. Em vão. Tinha como oposição o PT, então uma força ascendente e o robusto PSDB, de Mario Covas, Franco Montoro e Fernando Henrique Cardoso. E o PMDB, então sob comando de Quércia, não sabia se apoiava o governo ou esperava para colaborar com sua queda e apoiar o governo seguinte. Ficou com a segunda opção, pois sentiu o cheiro de sangue talvez até antes que o PT.

Abandonado – os mais velhos se lembram da frase “Não me deixem só”, grito desesperado de Collor a seus eleitores que, sem dinheiro no banco, queriam mesmo ver o presidente embarcando no helicóptero do adeus) ele passou pelo calvário do impeachment e acabou renunciando antes da cassação (que ocorreu assim mesmo), num processo que o acusava de ter comprado uma prosaica Fiat Elba com dinheiro arrecadado de empresas (propinas, mesmo) por seu tesoureiro Paulo César Farias. Detalhe: depois Collor foi absolvido de todas as acusações no STF, prova de que o processo foi muito mais político, como são todos os processos de impeachment. O cara é defenestrado por detalhes técnicos, plausíveis, claro, e suficientes para cassá-lo, mas nem tanto…). No fim, perde porque não consegue mais apoio político e nem popular para seu governo. O apoio político passa rapidinho para seu sucessor e ele se transforma em ex-presidente.

… A política sob Bolsonaro e seus filhos desandou completamente. Não há retorno para as desavenças com o PSL, e a briga nas redes sociais e nos microfones tem sido tão intensa que qualquer outro partido vai pensar duas vezes antes de abrir as portas para uma família cujo sobrenome deveria ser “Encrenca”. E não há partido, entre os grandes, que queira se arriscar.

Foi assim com Collor. Pode ser assim com Bolsonaro? Talvez. Ontem (sábado, 2 de novembro, coincidentemente Dia de Finados), Collor declarou em entrevista que esse filme (o do governo atual) ele já assistiu. E assistiu mesmo. Há semelhanças notórias entre o deserto político de Collor e o abandono gradual de aliados de Bolsonaro. As diferenças, e destas o atual presidente pode até se valer caso elas vinguem mesmo, são a economia e a segurança. Porque, na área política, o protagonismo dos presidentes do Senado e da Câmara em questões vitais para o país, prova a falta de jogo de cintura do governo. O resultado é que as reformas estão sendo aprovadas mais a gosto dos líderes do Congresso do que dos ministros autores desses projetos. Paulo Guedes e Sérgio Moro que o digam.

Repetindo a pergunta: pode ser com Bolsonaro como foi com Collor? Não há uma resposta definitiva, claro, os tempos são outros, a comunicação de tudo se faz de forma completamente diferente de quase trinta anos atrás e a economia dá sinais fracos, porém positivos, de que caminha para uma superação do enorme estrago feito pelo lulo-dilmismo-petismo durante 14 anos.

A política sob Bolsonaro e seus filhos desandou completamente. Não há retorno para as desavenças com o PSL, e a briga nas redes sociais e nos microfones tem sido tão intensa que qualquer outro partido vai pensar duas vezes antes de abrir as portas para uma família cujo sobrenome deveria ser “Encrenca”. E não há partido, entre os grandes, que queira se arriscar. Entre os pequenos pode até haver, mas diante do aumento dos valores dos fundos partidários e eleitorais, os caciques desses nanicos, que vivem muito bem mamando nesse 171 chamado processo eleitoral brasileiro, talvez também resistam em dividir o butim.

Sobram, portanto, a economia e a segurança para Bolsonaro tentar se manter no poder. Guedes e Moro têm se comportado da maneira adequada. Ambos não dizem uma palavra sequer que possa ser interpretada como hostil a Bolsonaro e seus três zeros à esquerda. E tocam suas pastas, passando por solavancos vários, engolindo sapos e tentando tornar realidade uma agenda que faria do Brasil algo bem melhor do que é hoje. Mas está difícil.

Arminio Fraga, que ajudou o Brasil a implantar o único plano econômico que deu certo em séculos, o Plano Real, hoje administra uma carteira de investimento de mais de 10 bilhões de reais. Entende muito de economia e de política. Pois Fraga disse, na semana passada, que há bilhões e bilhões de dólares no exterior esperando o Brasil resolver a crise política para aqui aportarem. Sim, a crise política. Não há investidor que arrisque seu rico capital num país cujas regras de convivência – políticas, econômicas e sociais – flutuem ao sabor de brigas partidárias, de fofocas nacionais, de milícias virtuais de esquerda e de direita e de “lives” que criam um inimigo imaginário por dia.

Sim, a crise política pode afetar a economia. Aí, o capitão ficará sem a escada mínima que tem hoje, e vai ter que se segurar na brocha. Collor, embora não seja amigo, avisou.

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Edmilson Siqueira é jornalista

1 thought on “Quem avisa nem sempre é amigo. Por Edmilson Siqueira

  1. – 87% da atual riqueza gerada no mundo parou na mão do 1% mais rico.

    – Os 50% mais pobres, ou seja, a metade mais pobre da população ficou com zero, nada, ou seja, essa média mostrou que o mundo cresceu. Mas existem dois mundos diferentes: é o mundo dessas pessoas presente no mundo real do dia a dia que não teve nada absolutamente nada, que não ficou nem com um pedacinho e tem esse 1% mágico que ficou com quase tudo. É como se tivessem dois filmes diferentes, então essa média é super enganosa.

    – O PIB cresceu 0.8% – que bom?! – mas calma aí. Você vai comer um papel escrito PIB? Você vai se alimentar de um relatório do governo? A verdade é que você somente pode alimentar-se da riqueza que irá parar na sua mão.

    E esse PIB que tá sendo gerado… ele está indo parar na sua mão?

    Esse PIB que está sendo gerado com essas novas medidas que estão sendo propostas, ele vai parar mais ou menos na sua mão?

    – O FMI previa em 2018 que o Brasil iria crescer 2,5 % em 2019. E porquê? Porque a economia brasileira estava tão deprimida, que qualquer coisa certa que fosse iria gerar crescimento do PIB.

    – Se uma coisa cai de 10 para 2 ela cai 80% e sobe de 2 para 4 ela sobe 100%. Então o efeito base é muito importante para parecer um crescimento grande. O governo Bolsonaro fez o brasil crescer menos de um terço menos do que era esperado. Então é com isso você tem que comparar, não é comparar com o pior crescimento que teve na história do Brasil dos últimos 30 anos. Este 0.8% de aumento do PIB é um desastre. Tudo o que ele fez deu errado.

    – A Bolsa não quer dizer que as coisas melhoraram para o cidadão- só beneficiam quem tem ação.

    A Bolsa ela só mostra o seguinte: que várias corporações empresariais que podem estar valendo mais que a economia, estão distribuindo recursos, estão saudáveis, valorizando e atraindo bons investimentos financeiros em ações, etc.

    Há as empresas que estão parecendo aumentar seu trabalho, sua produtividade cada vez mais, simplesmente porque que a lucratividade delas está aumentando; e a lucratividade delas pode estar aumentando em cima de uma margem muito maior, ou seja, o dono está ficando com todo um lucro da empresa cada vez maior enquanto os trabalhadores têm salários cada vez mais baixos e assim não estão ficando com nada(e o Guedes afirma que o pobre não faz poupanças).

    Se usarmos o índice da Bolsa como termômetro da economia, é um erro.

    Se atualizamos a Bolsa de 57 mil pontos em maio de 2015, daria 85 mil pontos em maio de 2019. Como a Bolsa em maio de 2019 está em 90 mil pontos, dá somente uma diferença de apenas 5 mil pontos.

    O único motivo do aumento das ações é que a lucratividade da empresa aumentou em cima de salários cada vez menores para os trabalhadores, em cima de uma

    reforma da previdência faz com que daqui pra frente também a mão de obra seja cada vez mais barata, em cima do pé de uma reforma trabalhista que vai fazer com que a mão de obra seja cada vez mais barata pra frente, em cima dessa organização do trabalho que faz com que a produtividade caia cada vez mais na mãos dos donos das empresas – todos motivos ruins.

    – A inflação caiu no Brasil porque a economia parou. A economia parou e ninguém compra nada, como ninguém compra, ninguém consome, o preço dos produtos matem-se ou cai e o país está com problema grave pois ninguém tem como investir, nem em que investir. A Inflação tem um piso e um teto – abaixo do piso e acima do teto significa que a economia está ruim.

    – Esse plano “Mais Brasil” vem consolidar a riqueza na mão dos 10% mais ricos, consolidar a riqueza na mão dos 1% mais ricos. E para os 90% dos trabalhadores mais pobres, esse plano só traz mais pobreza.

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