Navios fantasmas nas costas brasileiras. Por Aylê-Salassié F. Quintão*

NAVIOS FANTASMAS NAS COSTAS BRASILEIRAS

AYLÊ-SALASSIÊ QUINTÃO

… A hipótese de um navio fantasma parece corresponder às superstições do Halloween. Afinal, desde o Descobrimento contam-se histórias de navios piratas navegando pelas costas brasileiras. Parece que continuam aí até hoje. A do derramamento acidental ou a liberação do óleo de um navio afundado, são apenas explicações alternativas, destinadas, talvez, a confundir…

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O derrame de óleo cru de um navio fantasma, de um velho cargueiro afundado, ou um atentado? Em tempo de fake news, como hipóteses, nada é descartável na investigação sobre o petróleo bruto que se espalha criminosamente sobre a costa nordeste do Brasil, afetando a saúde da população, destruindo a fauna e a flora marinha, poluindo 283 praias, inviabilizando as atividades de milhares de pescadores e até atravessando as férias de fim de ano do brasileiro.

A hipótese de um navio fantasma parece corresponder às superstições do Halloween. Afinal, desde o Descobrimento contam-se histórias de navios piratas navegando pelas costas brasileiras. Parece que continuam aí até hoje. A do derramamento acidental ou a liberação do óleo de um navio afundado, são apenas explicações alternativas, destinadas, talvez, a confundir. Com relação à terceira hipótese, não se pode ignorar a possibilidade de um ato belicoso, de sabotagem mesmo, em resposta às insanidades reinantes no Brasil. As ações correspondem reações, às vezes de cara nova. Por quê, não?

Limpam-se as praias, mas identificar a origem desse gigantesco vazamento não deveria ser ideia desprezada. Todos querem saber de onde isso surgiu. Uma tal de “geointeligência” da Marinha, Polícia Federal, Ministério da Defesa teria detectado uma imagem de satélite, no dia 29 de julho (hoje é 4 de novembro), revelando a presença de uma enorme mancha de óleo a 395 milhas (733 km) da costa da Paraíba. Trabalhando sobre um universo de cerca de 900 embarcações que transitaram pela região no período, chegou-se ao navio de bandeira grega NT Bouboulina, da empresa Delta Tankers, cujo percurso rastreado, foi dar no terminal de carregamento de óleo cru de San José, na Venezuela, e que depois de passar pela África do Sul terminou localizado em Singapura, Malásia e agora está em alto mar. Um navio fantasma?!…

Pode parecer brincadeira, mas navios fantasmas fazem ainda parte da história e da realidade da navegação no mundo. Sempre transitando pelos mares abertos. Alguns nunca chegaram a ser conhecidos. Não tem registros ou os que são falsos; nem bandeiras pátrias e, em geral, andam com os instrumentos de navegação desligados. Com ou sem identidade, são embarcações que se ocupam do transporte de mercadorias clandestinas. Por essas razões, nunca são encontrados e, quase sempre evitam atracar em grandes portos. Os desembarques são feitos das maneiras mais estranhas, até mesmo nas águas, boiando, para que o outro venha e apanhe a mercadoria. O uso das correntes marinhas parece uma experiência nova. Deve ter um pessoal muito experimentado atrás da operação.

Navios fantasmas prestam serviços a qualquer um. Tem histórias macabras. É conhecida a do SS Morgan, um navio holandês, que explodiu e afundou nas costas da Indonésia, matando a tripulação inteira, em 1948. Ele estaria carregando clandestinamente nitroglicerina e outros materiais químicos usados na fabricação de armas bioquímicas. Caso similar foi o do Mary Celeste encontrado abandonado em alto mar. O navio transportava 1.700 barris de álcool, que estouraram, derramando dentro da embarcação.

O Flying Dutchman tem também uma história assustadora. Ao enfrentar uma tempestade, no Cabo da Boa Esperança, o capitão Vanderdecken, teria blasfemado contra Deus. O navio bateu em uma rocha, e submergiu, levando toda a tripulação. O maior navio da Segunda Guerra, o alemão Bismark, foi chamado de fantasma, por seu deslocamento rápido. Afundou mais de 1.000 embarcações. Os alemães tinham ainda uma frota de submarinos fantasmas armados com torpedos subaquáticos, que vasculhavam os mares. Os russos também, só que movidos à energia nuclear, até que dois deles, o Kursk K-141 e o Komsomolet, afundaram, equipados com torpedos, ogivas nucleares de plutônio, além de mísseis carregados de material tóxico e explosivo. Morreram cerca de 150 tripulantes, contaminando as águas do Mar da Noruega com material radioativo.

Resultado de imagem para bandeira pirata…Aos fantasmas sempre faltaram escrúpulos de ordem moral, ética e ideológica…

Pelos menos 11 submarinos da frota fantasma do Eixo, equipados com armamentos pesados, foram afundados em águas brasileiras, sendo 10 alemães (Unterseeboat) e um italiano. O programa de submarinos alemães teve papel destacado na Segunda Guerra Mundial. Além de torpedos subaquáticos, carregavam 208 toneladas de diesel combustível cada um. Ataques de U-Boat mataram mais de 1.000 brasileiros´. Mas, vazamentos de óleo 80 anos depois é uma hipótese difícil de ser admitida, mesmo porque o óleo muda de consistência.

Embora de cogitação  delicada, a possibilidade de um atentado  de caráter político – diria: revolucionário,tipo daquele que fazia Ho Chi Ming –, ou simbólico – uma advertência ambientalista de impacto – como as feitas pelo Greenpeace – , ou ainda econômico, como a tentativa de impactar o edital do Pré-Sal, podem ser descartadas. A toda ação corresponde uma reação. As palavras já não voam hoje como na época de Caio Tito. A linguagem usada pelos homens tanto pode ser a mais ingênua (Holderlin) como podem conter germens explosivos.

Foucault advertia que palavras geram ações. Por outro lado, constata-se que navios fantasmas tem funções muito maiores do que enxergam os místicos do Halloween. A questão é o que fazer, no caso de uma hipótese de sabotagem vir a ser confirmada, e seus agentes conhecidos. O governo está encabulado. Os militares assustados. Os advogados de plantão, como sempre, antecipam-se: primeiro, é preciso saber se o crime é doloso ou culposo…

Aos fantasmas sempre faltaram escrúpulos de ordem moral, ética e ideológica.

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Aylê-Salassié F. Quintão*Jornalista, professor, doutor em História Cultural. Vive em Brasília

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