Por Alexandre Schwartsman

… A real razão do colapso do investimento é a percepção de insustentabilidade da dívida pública no Brasil a menos que sejam aprovadas reformas que mudem radicalmente o regime fiscal no país, aumentando (jamais reduzindo) a flexibilidade do orçamento…

Artigo publicado originalmente na Folha de S. Paulo, coluna do autor, edição 6 de abril - 2016

Na semana passada comentei o plano perpetrado pelo Ministro da Fazenda, nelson barbosa, transformando a meta de superávit primário de R$ 24 bilhões em déficit de quase R$ 100 bilhões. A peraltice fiscal, contudo, não acaba aí: há pelo menos dois motivos adicionais para ficarmos ainda mais preocupados com a evolução das contas públicas no país.

Um é o “Plano de Auxílio aos Estados e Distrito Federal”, que, contrário ao espírito da Lei de Responsabilidade Fiscal, permite nova rodada de refinanciamento da dívida estadual, abrindo espaço para déficits adicionais da ordem de R$ 10 bilhões em 2016, R$ 19 bilhões em 2017 e outros R$ 17 bilhões em 2018.

… A verdade é que barbosa não consegue escapar da sua natureza. As medidas que anunciou no campo fiscal traem sua visão acerca da crise: como bom keynesiano de quermesse ele acredita que o problema da economia brasileira se origina da falta de gasto; daí os incentivos para o aumento da despesa pública…

O problema não vem de hoje. Nos últimos anos a Fazenda, com a anuência de barbosa, consentiu que estados se endividassem além da conta, embora o acordo firmado nos anos 90 dotasse o governo federal de mecanismos para evitar justamente a repetição deste fenômeno. Agora, ao invés de punir tal comportamento, o ministério premia a irresponsabilidade fiscal, reforçando a mensagem “gastem agora e não se preocupem com o futuro”.

Já o outro projeto aumenta o grau de rigidez orçamentária no país por meio da criação do Regime Especial de Contingenciamento, que limita cortes de gastos em situações de baixo crescimento. barbosa choraminga sobre a impossibilidade de alterar mais de 90% do dispêndio federal, mas propõe elevar ainda mais a proporção das despesas não contingenciáveis no orçamento.

A verdade é que barbosa não consegue escapar da sua natureza. As medidas que anunciou no campo fiscal traem sua visão acerca da crise: como bom keynesiano de quermesse ele acredita que o problema da economia brasileira se origina da falta de gasto; daí os incentivos para o aumento da despesa pública.

Trata-se de visão míope. Não há dúvida que a demanda interna despencou: o investimento cai desde meados de 2013, acumulando queda de quase 25% até o final de 2015, enquanto o consumo caiu nada menos do que 8% nos últimos 7 trimestres. As propostas ignoram, porém, as causas deste desempenho lamentável.

Por mais que se insista em jogar a culpa na suposta política de austeridade, a verdade é que: (a) a demanda vem caindo muito antes do anúncio de qualquer medida de redução de gastos; e (b) como bem lembrado pelo meu amigo Samuel Pessoa, a real queda do dispêndio público em 2015 é pequena demais para explicar a contração gigantesca da atividade, dado que nenhum keynesiano de quermesse teve coragem de encarar.

A real razão do colapso do investimento é a percepção de insustentabilidade da dívida pública no Brasil a menos que sejam aprovadas reformas que mudem radicalmente o regime fiscal no país, aumentando (jamais reduzindo) a flexibilidade do orçamento e permitindo a geração de superávits primários capazes de estabilizar a dívida e, à frente, reduzi-la como proporção do PIB.

Tornou-se óbvio que barbosa e o governo não apenas não têm condições de levar a cabo as reformas necessárias para isto, como agem exatamente no sentido oposto.

Não é por outro motivo que o fantasma do calote pela aceleração inflacionária, que se imaginava exorcizado, segue assombrando o setor privado. O exorcista às avessas invoca o demônio e segue sem entender porque o país passa pela pior recessão de sua história.hothot

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Alexandre-BSB• * ALEXANDRE SCHWARTSMAN – DOUTOR EM ECONOMIA PELA UNIVERSIDADE DA CALIFÓRNIA, BERKELEY, E EX-DIRETOR DE ASSUNTOS INTERNACIONAIS DO BANCO CENTRAL DO BRASIL É PROFESSOR DO INSPER E SÓCIO-DIRETOR DA SCHWARTSMAN & ASSOCIADOS

@alexschwartsman
aschwartsman@gmail.com

(O Blog A MÃO VISÍVEL, de Alexandre Schwartsman, agora integra o Site Chumbo Gordo, no http://www.chumbogordo.com.br/categorias/a-mao-visivel/)

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