Conselhos de velhos juristas a jovens advogados. Por José Paulo Cavalcanti Filho

CONSELHOS DE VELHOS JURISTAS A JOVENS ADVOGADOS

Por José Paulo Cavalcanti Filho

…Vamos dizer as coisas como as coisas são. Quase igual é o mesmo que diferente. Francesco Carnelutti. Sobre as virtudes no falar claro. Evitando acomodações. Esse jeitinho bem brasileiro de não ir à essência das questões…

Sempre imaginei escrever um livro com título assim. Talvez algum dia o faça. E aproveito esse 11 de agosto, Dia do Advogado, para indicar alguns conselhos que juntei nos caminhos percorridos. Para todos os fins, conto meu tempo de profissão desde quando o governo militar me proibiu de estudar no Brasil. Era 14 de abril de 1969, não dá para esquecer uma data dessas. Então fui para Harvard, mas essa história não interessa a ninguém. Certo é que, esperando pelo dia de partir, botei gravata e passei a dar expediente no escritório de meu pai. Tinha só 20 anos. E já faz uma vida. Vamos a alguns dos tais conselhos que aprendi por lá.

Quando se vai demasiado longe, o progresso consiste em regredir. Eduardo Spíndola (ministro do STF). Tantas vezes vi isso, na profissão. Pessoas que acreditavam estar sempre certas. Que não mudavam nunca de opinião. É um erro, senhores. Um pouco de modéstia não faz mal a ninguém. Outro conselho dele é Se não é preciso mudar, é preciso não mudar. Variável do dito americano Se não está quebrado, não conserte.

Nunca leia um artigo do Código mais que 6 vezes. Na sétima, ele vai começar a dizer o que você quer que ele diga. Clóvis Beviláqua (autor do Código Civil Brasileiro de 1916). A realidade não pode ser vista, ou lida, a partir de nossas conveniências. As coisas são o que são, por mais que não gostemos. Outro conselho dele é Não entende o que um artigo diz?, leia o anterior. Continua sem entender?, leia o seguinte. Sugerindo ampliar a visão, para bem compreender cada situação. Sem preconceitos. Mundo, mundo, vasto mundo, escreveu Drummond. E é mesmo.

Vamos dizer as coisas como as coisas são. Quase igual é o mesmo que diferente. Francesco Carnelutti. Sobre as virtudes no falar claro. Evitando acomodações. Esse jeitinho bem brasileiro de não ir à essência das questões. E sem receios de explicitar divergências. Elas nos enriquecem, amigo leitor. Uma crise da razão é, sempre, uma crise sem razão.

… Um problema é sempre um problema. Dois problemas, às vezes, é uma solução. Esse conselho é meu. Por tantas vezes ver que um segundo problema acaba sendo, mesmo, solução que cai do céu. Podem acreditar. Sugiro, ao leitor amigo, prestar atenção na regrinha.

Faça tudo que puder enquanto não sentir as primeiras mordidas da velhice. Noberto Bobbio. Um conselho que vale para todos nós. Bukowski escreveu sobre a lancinante dor da liberdade. Há outras. Entre elas, a lancinante dor de existir. Até porque como na frase atribuída a Shaw, Juventude é doença que tem cura.

Não entre em problema que você não seja capaz de resolver. Afonso Arinos de Melo Franco (presidente da Comissão que redigiu o projeto da Constituição de 1988). Pense bem antes de se meter em confusão. Duas vezes. Três. Se puder, corra dela. E não esqueça o conselho desse mestre, antes do primeiro passo.

Um problema é sempre um problema. Dois problemas, às vezes, é uma solução. Esse conselho é meu. Por tantas vezes ver que um segundo problema acaba sendo, mesmo, solução que cai do céu. Podem acreditar. Sugiro, ao leitor amigo, prestar atenção na regrinha.

A mão aberta é um tapa. A mão fechada é um murro. E é a mesma mão. De meu pai, José Paulo Cavalcanti, maior jurista que conheci. Sobre a importância de escrever bem. Esquecendo o que não é essencial. O adjetivo. O que não têm importância. E indo sempre ao centro da questão. Um belo conselho. Saudades do velho.

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jose_paulo_cavalcanti_filho_02José Paulo Cavalcanti Filho É advogado e um dos maiores conhecedores da obra de Fernando Pessoa. Integrou a Comissão da Verdade.

jp@jpc.com.br

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