Um País sem estadistas. Por Aylê-Salassié F. Quintão*

UM PAÍS SEM ESTADISTAS

AYLÊ-SALASSIÊ F. QUINTÃO

Transita-se no Brasil por um ambiente tóxico: faltam estadistas…

Quem é oposição ao Governo esforça-se para atrapalhar a governabilidade, quem está dentro não sabe o que fazer. Dos dois lados faltam sensibilidade, bom senso e compromisso com a solução dos problemas da população, potencializados pelas tragédias das inundações.

Festeja-se o carnaval em meio a facadas, tiroteios, mortes, polícia, bandidos   e “muita alegria”, sem se lembrar das milhares de famílias acampadas em escolas e ginásios, depois de terem perdido tudo na calamidade que quase arrasou cidades como São Paulo, Belo Horizonte e Rio de Janeiro. Solidariedade, bom senso?! O Estado proverá.  A China suspendeu os tradicionais festejos do Ano Novo, e o Japão cancelou a comemoração pública do aniversário do imperador Naruhito.

… Faltam lideranças políticas com credibilidade, estadistas, figuras versadas na arte de ser governo, que conduzam a sociedade com sabedoria, sem limitações partidárias ou ideológicas.  Aristóteles descrevia os estadistas como os governantes que “produziam um certo caráter moral” e uma disposição para as virtudes, no que foi referendado por Tomás de Aquino…

Desfruta-se, assim, por aqui, de um estado de barbárie, como se estivéssemos vivendo o período inicial da chamada conquista civilizatória.

No campo da política, “Bocas sujas”, falas rudes e agressivas protagonizam, nesse mesmo ritmo, um carnaval à parte, produzindo, ininterruptamente, calúnias e difamações entre si, estimulados pela proximidade das eleições. Não há qualquer preocupação com as responsabilidades do Estado, e nem o menor respeito pelos governantes.

Faltam lideranças políticas com credibilidade, estadistas, figuras versadas na arte de ser governo, que conduzam a sociedade com sabedoria, sem limitações partidárias ou ideológicas.  Aristóteles descrevia os estadistas como os governantes que “produziam um certo caráter moral” e uma disposição para as virtudes, no que foi referendado por Tomás de Aquino: “virtudes e os valores (cristãos?) são inseparáveis da prática política.” Para o economista Bresser Pereira, o estadista “é capaz de aliar a visão dos grandes problemas nacionais à coragem para enfrentá-los”. Na Cartas a um Jovem Político, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso destacou, como estadista, …o governante que, uma vez convencido do pleno acerto de uma decisão, aceita uma única atitude de si mesmo: tomar essa decisão“. Quando presidente do STF, Joaquim Barbosa, declarou que “o Governo não precisa de tributaristas ou de criminalistas. Precisa de estadistas“.

No Brasil seriam candidatos ao reconhecimento Getúlio Vargas, que detonou a oligarquia de base rural; e Juscelino Kubitschek, que fez o País escalar alguns degraus no processo civilizatório. Ambos estiveram à frente do seu tempo, preocupados com o futuro da Nação e com as novas gerações, independente de raça, gênero ou sexo. Estatista é, portanto, muito diferente do político, este centrado sempre nas próximas eleições.

O cenário parece indicar que o País está diante de uma das piores safras de políticos e governantes. Ressente-se da falta de pessoas com talento, tenacidade e capacidade para governar e reordenar uma nação combalida por uma política fiscal confusa, uma elevadíssima taxa de desemprego, uma economia que não sai do lugar, e que, diante do descrédito crescente das soluções revolucionárias, também  não contribui para que sejam assegurados os direitos mínimos necessários  à população.

…Simone Tebet afirma seguir os caminhos conciliadores e os conselhos do pai: o político não chega ao Poder para ser servido, mas para servir. Defende a existência de outras formas de fazer política, fora desse espaço carnavalesco, irresponsável, extremado e populista.

Mas, em que pese as visíveis decepções, o futuro parece dar algum sinal. No horizonte do Estado ou do estadismo surge um personagem quase aristotélico, ainda pouco conhecido, mas que já deu demonstrações de sensibilidade, bom senso, força política e decisória, recusando-se a se beneficiar de vantagens oferecidas pelos próprios companheiros da política.

Pode-se enganar, mas o perfil atual mais próximo da configuração acima parece ser o da senadora (advogada e professora) Simone Tebet, que tem sob sua responsabilidade, neste momento, dar celeridade à uma dezenas de  reformas  voltadas para a correção de vícios, aos poucos instalados, nas relações entre o Estado e a Sociedade. Presidente da Comissão de Constituição e Justiça, do Senado, depois de chefiar a Comissão da Mulher, Tebet tem agido com autoridade, sem perder o fio da meada, nos dispersivos debates polarizados dentro da Comissão. Tem aberto caminhos para a tramitação de projetos considerados importantes. Tem compensado à fragilidade do interessado original, o próprio Governo.

Simone é filha de um dos políticos mais respeitados que passou pelo Congresso Nacional: o advogado e também professor Ramez Tebet, eleito com a maior votação, no estado de origem, o Mato Grosso do Sul, governado por ele. No Parlamento, foi homenageado por sua capacidade de negociação e tolerância, não apenas no exercício da Presidência, mas também das Comissões de Ética e  das Mistas que apuraram a corrupção no Judiciário e na Sudam, bem como na condição de membro titular das comissões  de Justiça e de Economia. Morreu em 2006, com quarenta anos de vida pública. Sem Ulysses Guimarães e sem ele, o PMDB tornou-se refém e lócus dos interesses políticos privatizados no Estado.

Ex-professora, militante estudantil “cara pintada”, Simone Tebet afirma seguir os caminhos conciliadores e os conselhos do pai: o político não chega ao Poder para ser servido, mas para servir. Defende a existência de outras formas de fazer política, fora desse espaço carnavalesco, irresponsável, extremado e populista.

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Aylê-Salassié F. Quintão*Jornalista, professor, doutor em História Cultural. Vive em Brasília

 

 

 

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