leitores re-finados

Leitores re-finados. Por José Paulo Cavalcanti

LEITORES  RE-FINADOS

JOSÉ PAULO CAVALCANTI

livro

O melhor, para quem escreve, é a reação do leitor. Como se deu na última coluna, Quase Finado.

Seguem alguns comentários:

RELIGIOSOS

Padre Sérgio Absalão, da Igrejinha dos Aflitos (Rosa e Silva), presta homenagens a Deus: “Sua negação leva a uma afirmação, pois ninguém pode negar o que não existe. Parabéns, homem de grande fé”.

Goiano: “Quanto à questão da crença, dou um conselho, não espalhe; para que Ele não fique sabendo”.

João Francisco foi duro: “Se não acreditas em Deus, deves mesmo se preocupar se seu corpo ficará do lado da sombra ou do sol no cemitério, depois de enterrado. É o que lhe resta”. Pois é…

Marco Antonio Zanfra, jornalista: “Deu vontade de começar a planejar meus próprios velório e enterro”. Talvez não seja uma boa ideia, Marco.

Chiquinho de Olém, filósofo: “A morte, é certa! Deus, não existe! E o que somos? Poeira das estrelas”. Prefiro ficar fora dessa briga.

Luzilá Gonçalves, imortal, diz que, no céu, “encontrarás gente boa, como o padre Edvaldo”. E aconselha seguir, sempre, os conselhos de Lecticia, que é “senhora de grande saber”.

Sócrates Times Neto, engenheiro químico: “Havendo inferno, é onde irei parar. Se a saudade for tanta, e será, vou lhe convocar”. Vade retro, doutor. Fique por lá sozinho.

AMANTES DE CHARUTOS E ÓCULOS

José Jardelino, pesquisador: “Vou levar um Trinidad, ao invés do Montecristo”. Boa escolha.

Brito: “Diga a Dona Lecticia que com Paulo Francis foi assim, de óculos na cara, e ficou muito bem apresentado. Diga mais que, sem ele, pode ser que o porteiro (São Pedro) não o reconheça e até vede sua entrada, né não?”. É, sim.

Arael da Costa lembra que “o mesmo aconteceu com o advogado e poeta Celso Octávio de Novais, que também se enterrou com óculos por conta de sua miopia em alto grau”.

Assuero apoia minha tese: “Bem bolado. Isso vai lhe permitir ser identificado por óculos, charuto, paletó e a comenda”. Deus te ouça.

OTIMISTAS

João Bosco Oliveira, da Genomika-Einstein: “Tá otimista demais, amigo. 2050 já quebrava um galho, não?”.

Salmen Giske, construtor, contraditou: “Para João Bosco, gênio da Genomika-Einstein, 2.050 já estaria bem. Para ele, talvez. Para nós, é muito pouco”.

Mauro Ramos, advogado: “Espero que seus últimos desejos demorem a ser atendidos”. Eu também, colega.

Valdecir Pascoal, do TCE: “Ri de morrer, mas só lá pra depois de 2520…”. Já certo de que vou na frente dele, claro.

Ronaldo Ferreira tenta me animar: “Os grandes homens nunca morrem, apenas deixam de conviver com os reles mortais”. Confio não.

Laurentino Gomes (de 1808 e Escravidão): “Queria eu morrer assim, com tanto ânimo, tanta alegria e tanta gana pela vida”.

Marcelo Tas, jornalista: “Que avancem as primaveras, até porque não há plano B. E viva Kamala!”

Giovanni  Scandura,  publicitário,  lembra  diálogo  de  duas  irmãs   suas: “– Geórgia, eu quero morrer! – Que, nada!, Célia: tu vai aos médicos todos os dias… como posso acreditar?”.

OUTROS

Cristovam Buarque: “Tentei, vou pedir que coloquem no meu (túmulo). Cada um que pense o que eu tentei”.

O Mestre Roberto daMatta, sem atentar que imortais como ele não morrem, diz “Espero ir primeiro”.

Outro imortal, Xico Bizerra, lembra que deveria por também, no caixão, um livro. Mas “de papel. Nada de e-book. E tomara que, no ano 2500, livro de papel ainda haja. No mais, lamentarei não poder ir a seu féretro, pois o meu terá sido em 2499”.

Olbiano Silveira, jornalista, diz não ter gostado muito de ler por estar “Na cama do hospital tentando driblar a Covid”.

O jornalista português Victor Moura-Pinto sugere que o texto foi “suavemente filosófico”. Como se fosse, a morte, algo suave. Ou filosófico.

Aluizio Maranhão, secretário da Redação de O Globo: “Espero que tudo esteja sob controle” Controle, como?, amigo. Quem controla a morte?

O Ministro Flávio Bierrenbach, que pretende levar no caixão “um canivete suíço”, contou que seu pai era Segundo Tenente na Revolução Constitucionalista de 1932. Num fim de tarde, cercado, acabou se escondendo no mausoléu da família (Cemitério da Consolação). Junto com Américo Piva. De noite, naquela escuridão, o amigo decidiu ir para lugar um pouco mais claro: “Prefiro dormir ao lado da Marquesa de Santos, logo ali em frente”.

LITERATOS

Rafael de Menezes, Juiz, lembra o beneditino alemão Anselm Grun: “A falta de humildade (soberba) provoca o medo diante da velhice, da doença, da solidão, quando é certo que a morte chegará para todos; admita o medo, transforme-o em serenidade, aceite a morte e encontre a paz”.

Ignez Barros, erudita, cita Jules Renard na língua dele: “C’est si ennuyeux, le deuil! A chaque moment, il faut se rappeler qu’on est triste”.

Bóris Trindade, criminalista, lembra o poeta português (e amigo querido) Manoel Fonseca: “Isso de estar vivo, um dia acaba mal…”.

Admaldo Matos, mais um imortal: “(Edgar A.) Poe teria inveja”. Também, para quem morreu bêbado, numa sarjeta…

José Carlos Vasconcelos, editor da Revista Visão (Portugal), aproveita e manda poema, Tempo de Elegia, por ele escrito:

Agora, mãe, é só silêncio.

Ou, como acreditavas,

haverá jardins celestiais

com camélias e magnólias,

anjos, arcanjos  e querubins

como gravuras de velhos postais?

Eu, mãe, não acredito.

Não acredito e tenho pena.

É só silêncio. Silêncio de chumbo

sem sequer um grito ou o grasnar dum corvo negro

Ah, se ao menos pudesses escutar

a brisa e a música

dos versos que escrevo”.

P.S. Para quem por acaso não leu, segue a coluna.

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José Paulo Cavalcanti FilhoÉ advogado e um dos maiores conhecedores da obra de Fernando Pessoa. Integrou a Comissão da Verdade. Vive no Recife.

jp@jpc.com.br

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