vento estocado

Estocando vento. Por José Horta Manzano

…  Lá pelas tantas – pra quem quiser recordar, é fácil encontrar no YouTube –, Madame afirma que o Brasil tem hidroelétricas e que a água é de graça. Diz também que o Brasil também tem vento, mas que não dá pra estocar vento…

vento estocado

Era 25 set° 2015. Dilma discursava num evento patrocinado pela ONU. Como de costume, falava de modo confuso, com frases que nem sempre tinham começo, meio e fim. Talvez até quisesse dizer algo, mas a mensagem não passava, como se entre ela e o ouvinte houvesse uma parede. Algum som passava, mas as frases chegavam rateando.

Lá pelas tantas – pra quem quiser recordar, é fácil encontrar no YouTube –, Madame afirma que o Brasil tem hidroelétricas e que a água é de graça. Diz também que o Brasil também tem vento, mas que não dá pra estocar vento.

Ah, pra quê! Ela foi alvo de uma avalanche de críticas, sarcasmos e gozações. Jornais publicaram charges, o fruteiro da esquina deu risada, o motorista de aplicativo comentou com um sorriso maroto, até o porteiro do condomínio tirou uma casquinha e abanou a cabeça.

Somada ao fato de haver afirmado dois anos antes que acreditava no ET de Varginha, essa da estocagem do vento selou a entrada de Madame no panteão das personalidades excêntricas. (Dizem que um rico que age fora dos padrões normais é excêntrico, mas um pobre nas mesmas condições é louco. Que cada um tire suas conclusões.)

vento

Estadão, 12 mai ’22

Mas o mundo gira. Sete anos depois do vento de Madame, parece que os cientistas estão descobrindo modo de armazená-lo. Isso pode ser visto de duas maneiras. Pode-se dizer que não passa de coincidência e que a fala da doutora não tem nada a ver com a descoberta dos cientistas. Pode-se também dizer que Madame era uma visionária com o dom de levantar um problema antes de todo o mundo. Talvez tenha sido inspirada pelo ET de Varginha, vai saber.

Agora, que estamos no caminho da solução do problema da estocagem do vento, Madame está 50% perdoada. Para receber absolvição completa, tem de revelar ao país se a ideia foi dela ou se foi sugestão do ET. Depois disso, o nó estará desfeito. Conforme for, passaremos todos a acreditar tanto na estocagem de vento quanto no ET.

Agora, sem brincadeira, tente comparar por um instante a personalidade de Madame com a do capitão.

Têm características comuns. São ambos irritadiços, mandões, incompetentes, ignorantes, presunçosos, desbocados, sectários. Devem ter outros pontos em comum que não me ocorrem neste momento.

Mas têm diferenças importantes. Da boca de Madame, não me lembro de ter ouvido palavrão soltado em público. Já da boca do capitão, cruz-credo! Quando ele se prepara para falar, é bom tirar rápido as crianças da sala. Ele próprio não se dá ao respeito, razão pela qual não pode esperar pelo respeito de ninguém. Do jeito que se comporta, o capitão é tão respeitado quanto o pinguço que, acotovelado no bar da esquina, resmunga palavrões.

O grande estrago que Madame provocou no país foi de ordem econômica, com sua “nova matriz”, que já veio bichada e com prazo vencido. Mas a economia, sabe como é, estraga-se hoje, amanhã está consertada. Não se lembra como o Plano Real deu um jeito, num piscar de olhos, numa inflação que fermentava havia 50 anos?

Já o estrago provocado pelo capitão é bem mais profundo. Os milhares de quilômetros quadrados de floresta destruída não crescerão nunca mais. Ele acelerou o caminho da desertificação de nosso território. As armas distribuídas a torto e a direito não voltarão ao fornecedor; parte considerável delas vai irremediavelmente terminar nas mãos do crime organizado. As terras da União doadas a grileiros, agora com escritura passada em cartório, não voltarão ao cofre da viúva – são nacos de nosso território ofertados aos amigos do rei, e perdidos para sempre.

A lista é longa. Poderia citar dezenas de exemplos. O problema é que, a cada linha que escrevo, vai batendo o desânimo. Paro antes que venha a depressão.

pandora

 Conclusão

Acho que até a doutora, apesar da ignorância, da mandonice e da incompetência seria menos nociva para “essepaiz” que o capitão. Se este blogueiro (que jamais votou no PT) tivesse de escolher entre os dois, não hesitaria um instante.

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JOSÉ HORTA MANZANO – Escritor, analista e cronista. Mantém o blog Brasil de Longe. Analisa as coisas de nosso país em diversos ângulos,  dependendo da inspiração do momento; pode tratar de política, línguas, história, música, geografia, atualidade e notícias do dia a dia. Colabora no caderno Opinião, do Correio Braziliense. Vive na Suíça, e há 45 anos mora no continente europeu. A comparação entre os fatos de lá e os daqui é uma de suas especialidades.

2 thoughts on “Estocando vento. Por José Horta Manzano

  1. Discordo. A senhora em questão se dizia Dra em economia, e não havia concluído. Ela pensava ser a melhor economista que já pisou neste planeta, mas fez um estrago na economia que até agora não reparamos (e o covid ajudou o retraso). Temos uma imprensa que perdoa qualquer declaração infeliz dos Ptistas e exagera qualquer coisa do Bolsonaro. Voc~e não comentou que havia corrupção liberada herdada do governo do 9 dedos, contudo essa senhora pouco fez e nada apurou. O atual governo não merece reeleição (e não terá meu voto), mas defender 9 dedos ou madame que retirava empregos dos comediantes de tanta asneiras, é dose !

  2. Caro Manzano,
    Em todas as eleições, os “palpiteiros” da mídia dizem para que pensemos bem em quem votar, única forma de mudar alguma coisa no país.
    Seria, se o sistema eleitoral dessas opções sem “gesso”.
    Como mudar se são sempre os mesmos?
    Ou, filhos, netos, esposas, amantes etc. daqueles que a muito se locupletam às custas do trabalhador- aquele que gera riqueza – não os afortunados que depois de um concurso – ou muitas vezes mesmo sem – viram os marajás do serviço público.
    Quando Rodrigo Maia se casou, lembro de uma faixa estendida próxima à igreja, pedindo – “ Por favor, não procriem” – infelizmente não obedecida.
    Como mudar o congresso – minúsculo mesmo – se um “puxador” de votos carrega consigo uma multidão de conhecidos ou desconhecidos que para lá se encaminham com o intuito de roubar, negociar para si ou para grupos já determinados.
    Fala-se que o voto distrital poderia melhorar a situação, mas cadê interesse dos políticos em fazer tal mudança?
    Assim, continuamos com os mesmos ou seus descendentes, amigos, “cupinchas” , apaniguados, e por aí vamos…
    Para a próxima eleição – no cargo máximo – temos ex condenado, cujos delitos são sobejamente conhecidos pronto para nos levar de volta para o século XX e, um falastrão que quer terminar sua obra de enterrar de vez o país, um grande estelionatário político que gosta de concentrar poder e terceirizar os problemas…
    Difícil escolha, mesmo para mim que embora não precise votar pela idade, creio ser meu direito comparecer às urnas, mesmo para anular todos meus votos.
    Inté!

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