goiabada basta

by Arend van Dam, desenhista holandês

…Nem esperava um definitivo “desta vez, vai!”, mas já me contentaria com um esperançoso “parece que sossegou”. Pra quem é, goiabada basta – como diziam os antigos. Do jeito que as coisas estavam, um pouco de silêncio já seria um bálsamo…

 

goiabada basta
by Arend van Dam, desenhista holandês

 Virada a página Bolsonaro e passado o 8 de janeiro, acreditei que as coisas melhorassem. Nem esperava um definitivo “desta vez, vai!”, mas já me contentaria com um esperançoso “parece que sossegou”. Pra quem é, goiabada basta – como diziam os antigos. Do jeito que as coisas estavam, um pouco de silêncio já seria um bálsamo.

No entanto (tem sempre um porém pra atrapalhar), as coisas não parecem estar se endireitando. Senão, vejamos.

Em política externa, Lula se esmerou em escolher o lado errado na crise russo-ucraniana, que chacoalha o mundo.

Em política interna, já manteve no cargo ministro malandro que assalta os cofres do Estado para visitar feira equina. Já catou pelo braço o chefe do MST e deu-lhe a honra de viajar à China de aerolula, afago reservado a poucos.

Apesar de ter jurado retornar à decência republicana, Luiz Inácio, até agora, falhou. O cidadão esperançoso que aguardava nítida melhora desde o 1° de janeiro ficou com a goiabada mesmo. Sem queijo.

É verdade que acabaram ataques às urnas, às instituições, à mídia e às minorias. Por seu lado, porém, conchavos, condescendência para com assessores duvidosos e posicionamentos do lado errado da História continuam na ordem do dia. Como nos tempos do capitão.

Faz poucos dias, Lula deu a entender que quer porque quer furar poço de petróleo na região amazônica. Nos tempos atuais, é decisão estapafúrdia, que renega as juras de parar de agredir a fabulosa natureza brasileira, promessas feitas por um Lula candidato. Muita gente tinha acreditado – inclusive e principalmente no exterior.

Está também no capítulo agressão à natureza o “desconto” concedido a comprador de carro novo. Na verdade, desconto não é, pois não passa de supressão de imposto. E imposto, se não for pago por este, terá de ser pago por aquele. Do bolso do presidente é que não sai. O mundo se dirige a um futuro descarbonado, e eis que o Brasil incentiva a compra de carros de motor térmico. Faria sentido dar desconto para carro elétrico (ou a hidrogênio, ou a vento), mas desconto pra carro tradicional não tem cabimento.

Na mais recente façanha do andar de cima, há participação atuante do Congresso. Como todos já sabem, nossa política para o meio ambiente, cujo melhor trunfo foi a nomeação de Marina Silva, está sendo suprimida e sucateada por nossos próprios parlamentares. Numa operação nada sutil, estão desidratando os poderes dos ministérios onde se decidem as ações dedicadas ao desenvolvimento sustentável e respeitoso do meio ambiente. Francamente, contando, ninguém acreditaria.

O Brasil de 2023 está se saindo parelho ao Brasil de 2019. Cara de um, focinho do outro. Quem deseja ver as coisas mudarem de verdade vai ter de esperar 2027 e torcer pra que o estropício atual não seja reeleito e que o estropício anterior não volte. Nem um, nem outro, nem nenhum de seus respectivos capangas.

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JOSÉ HORTA MANZANO – Escritor, analista e cronista. Mantém o blog Brasil de Longe. Analisa as coisas de nosso país em diversos ângulos,  dependendo da inspiração do momento; pode tratar de política, línguas, história, música, geografia, atualidade e notícias do dia a dia. Colabora no caderno Opinião, do Correio Braziliense. Vive na Suíça, e há 45 anos mora no continente europeu. A comparação entre os fatos de lá e os daqui é uma de suas especialidades.

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3 thoughts on “Goiabada basta. Por José Horta Manzano

  1. Caro Manzano,
    A ser completado o mandato atual de Lula, o PT terá administrado o país por 18 anos, inclusos os anos de Dilma.
    E querem mais, já preparando 2026 e eleições seguintes.
    A ideia é se perpetuar no poder, tal qual nos países onde buscam inspirações.
    No período petista tivemos três escândalos de grande porte – já que falar da tapioca paga com cartão corporativo do Orlando Silva é como bater em cachorro morto – e um impeachment.
    A saber: “mensalão” e “petrolão” do Lula e as pedaladas de Dilma, que levaram ao seu impeachment.
    O atual mandato não sabemos o que virá, mas pelo andar da carruagem, esperar o que?
    Dois anos de Temer foram corroídos pelo assunto da JBS (o famoso diálogo “”tem que manter mesmo, viu?”); convenhamos também que foi pouco tempo para fazer alguma coisa, mas mesmo assim foi diferente, tivemos alguém fora do tal confronto quem é pior.
    Desenterramos até a mesóclise.
    Chegado ao poder, Bolsonaro parecia ser a mudança tão esperada, aquele que faria a diferença, acabaria com o governo sindical do PT e, finalmente teríamos o governo para todos os brasileiros e, não para um grupo seleto de apaniguados.
    Infelizmente, não foi dessa vez.
    Veio a tal pandemia, o total desconhecimento do capitão com o cargo que representava, as escaramuças inúteis com vários setores importantes, desembocando no retorno do indesejado: “nós e eles”.
    Bolsonaro em certos instantes me fazia lembrar aquele funcionário que consultava a folhinha para ver os feriados e as “pontes”, para sair do corpo de presidente e curtir a vida.
    Não se governa como se dirige um sindicato – como o PT – nem tampouco com tão pouco apego ou no grito, como Bolsonaro.
    Perdeu-se a grande oportunidade de levar adiante no Congresso a lei que permitia a prisão de condenado em segunda instância, o que abriu a porta da cadeia para o atual governo e, estamos nós com a abertura das catacumbas por ver o retorno de personagens que acreditávamos estar definitivamente banidos da vida pública.
    Hoje, o poder está esparramado para várias vertentes e, dele se apropria grupos ou pessoas para seu próprio interesse.
    O Congresso faz o que sempre fez: dificultar para obter vantagem, seja em cargos ou dinheiro público, cujo destino nunca fica muito claro.
    Tudo acaba no mesmo saco: os de sempre ganham e nós aqui de baixo pagamos a conta.
    Nem mesmo temos esperança no judiciário, que deixou de ser seguidor e aplicador da lei, para criar e entender os preceitos legais ao sabor de quem e o que é julgado.
    E, segue o baile…
    Abraço
    Inté

    1. Caro Xará,

      Parabéns pela excelente resenha da política nacional deste novo século. Na sua primeira frase, onde se lê: “inclusos os anos de Dilma”, li: “inclusos os DANOS de Dilma”. Juro que é verdade.

      Abraço.

  2. “O Brasil de 2023 está se saindo parelho ao Brasil de 2019.”
    Aqui repito a frase de sempre: Lula e Bolsonaro se equivalem na letalidade implícita para o país que cada um carrega em si.
    Nem um, nem outro foi meu mote à época das urnas. E continuo a repeti-lo.
    Só ingênuos, desavisados ou espertos acreditaram que com Lula, e seu passado de folha corrida, seria diferente.
    Quanto ao “desconto” para automóveis, é uma maquiagem: quem tem memória lembra que o governo petista já fez o mesmo com a chamada “linha branca” – uma festa, à primeira vista – e que endividou a população crédula que caiu na esparrela. Cairão novamente e desta vez se endividarão para o resto de suas vidas.

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