EDUCAÇÃO

Por que a Educação brasileira não melhora? Por Dagoberto Alves de Almeida

A questão fundamental de aumento e efetividade de investimento na educação pública, gratuita, de qualidade, para todos em todos os níveis é possível e não precisa ser nenhum PhD em Economia para entender o que qualquer dona de casa previdente sabe quanto à necessidade de equilíbrio entre o que se gasta e o que se arrecada…

O que são recursos educacionais abertos - Crescer com Educação

O Brasil está na rabeira dos países quanto ao desempenho educacional de sua população, notadamente na dos mais jovens. Tal como demonstrado em testes como o PISA o desempenho dos estudantes brasileiros é sofrível pela incapacidade de entenderem um texto, realizarem as operações aritméticas mais básicas e compreenderem os fenômenos físicos que os cercam. Situação ainda mais agravada nos extratos das classes D e E onde a fragilidade socioeconômica é mais pungente.

A escola provida de instalações adequadas, um currículo humanista bem ministrado por professores capacitados e motivados, com merenda escolar de qualidade e na qual os alunos usufruem de efetiva segurança se traduz em um ambiente de exercício da cidadania. Nesse contexto, a responsabilidade pela baixa efetividade das políticas públicas educacionais não deve ser calcada na falta de interesse dos alunos, mas fundamentalmente na vulnerabilidade social e econômica a que estão sujeitos. Não há outra razão a explicar por que apenas 3% dos alunos mais pobres tem conhecimentos adequados de matemática contra 33% dos mais ricos.

Para resolver de vez o péssimo sistema educacional brasileiro é preciso, antes de mais nada, vontade política dos três poderes e para tanto não faltam dados e estudos que mostram, sobejamente, as causas estruturais e conjunturais que afligem a educação de nossas crianças e jovens.

A exemplo do que ocorreu em países como Coreia do Sul e China para que a educação brasileira seja, de fato, um instrumento para alavancar nosso progresso socioeconômico é preciso que o investimento seja multiplicado por 5 para que o gasto anual médio por aluno de 2.981 dólares se iguale aos 10.510 dólares da média dos países da OCDE. Esse investimento — seriamente monitorado para impedir os escandalosos e recorrentes desvios de recursos, como os que atingem o FUNDEB — aplicado em instalações e equipamentos, mas principalmente no desenvolvimento de pessoas.

A aplicação orçamentária em pessoas refere-se à ampliação, capacitação e melhoria da remuneração de pessoal docente, mas sujeita à periódica avaliação de desempenho. Mesmo porque quando o professor se apresenta desmotivado e despreparado o prejuízo que acarreta afeta muitas dezenas de alunos anualmente ao longo das décadas de sua vida profissional.

Da mesma forma, a ampliação e efetivação do orçamento em educação também evitará que continue a existir escolas nas quais, escandalosamente, falta o básico em termos de saneamento e agua potável. Recursos que bem administrados garantirão a construção, manutenção e atualização de infraestrutura para escolas de tempo integral bem providas de equipamentos, computadores e internet condizentes com as necessidades pedagógicas do alunato.

A questão fundamental de aumento e efetividade de investimento na educação pública, gratuita, de qualidade, para todos em todos os níveis é possível e não precisa ser nenhum PhD em Economia para entender o que qualquer dona de casa previdente sabe quanto à necessidade de equilíbrio entre o que se gasta e o que se arrecada. A racionalidade na gestão de recursos impõe a priorização de gastos entre as demandas mais críticas e urgentes e aquelas que podem ser eliminadas ou postergadas para um momento propício. Todavia, não é o que usualmente se pratica no âmbito da governança institucional. O exemplo mais escrachado desta aberração está na realpolitik das emendas parlamentares bilionárias transformadas em obrigação pela hipoteca dos recursos do Executivo ao Parlamento em nome da governabilidade.

As emendas parlamentares atingiram o pico de 37,4 bilhões em 2020, quando eram então chamadas de Orçamento Secreto. Embora menos “secretas” a prática continua, agora com um detalhe curioso: embora o valor empenhado tenha timidamente reduzido para R$35,33 bilhões em 2023 elas estão individualmente mais caras. Cada emenda saltou, em média, de 1,71 milhões de reais em 2017 para 5,67 milhões em 2023. A produtividade de parte do nosso parlamento nesse quesito é espantosa.

Ora, nem na ficção mais desvairada se tem a esperança de que o Congresso possa praticar um ato cívico sem precedentes de reverter esse montante astronômico para a educação pública. No entanto, a título de elucubração ética vale destacar o lançamento recente do Programa Escola de Tempo Integral, no qual foram prometidos 4 bilhões de reais para a criação de 1 milhão de matrículas na Educação Básica, incluindo creches. Neste cálculo, cada vaga na Escola de Tempo Integral sairia por um acréscimo de 4 mil reais. Então, se os R$35,33 bilhões de reais empenhados nas Emendas Parlamentares fossem usados para este nobre propósito, em vez de pulverizá-los em obras eleitoreiras, 8,75 milhões de crianças e adolescentes brasileiros seriam beneficiadas. Montante que representa quase um quarto dos 153,2 bilhões de reais requeridos para que todos os 38,3 milhões de alunos da rede pública da Educação Básica frequentem Escolas de Tempo Integral.

A relevância deste tema é inquestionável dado o fato de que o Brasil, segundo o Censo Escolar 2022, tem apenas 6,9% das suas 178,3 mil escolas públicas com 20% a 50% de seus estudantes matriculados em tempo integral e que um montante de 50,7% (90.487) das escolas não possuem estudantes com jornada integral. Essa situação afronta a Meta 6 do Plano Nacional de Educação que é a de oferecer educação em tempo integral em, no mínimo, 50% das escolas públicas, de modo a atender a, pelo menos, 25% dos alunos da educação básica.

A propósito, aproveito para abordar um argumento que vez ou outra se apresenta. A de que se deveria reverter os recursos investidos nas Instituições Públicas de Ensino Superior para a Educação Básica. Esse argumento é falho por numerosas razões, dentre elas está o fato de que a quase totalidade da ciência e tecnologia produzidas no Brasil tem a participação direta e indireta das instituições universitárias públicas. Esse argumento é também falacioso na medida em que descontrói uma conquista histórica da sociedade brasileira para a formação acadêmica e profissional daqueles que comandarão o país em numerosas áreas — agora aprimorada com a política pública de cotas. Essa equivocada argumentação defende a melhoria do desequilíbrio de investimento não necessariamente pelo aumento de investimentos na Educação Básica, mas pela redução de investimentos na educação superior. Vale também salientar o fato de que a educação superior é, intrinsecamente, mais cara do que a dos demais níveis, aqui e em qualquer lugar do planeta, pois que não se trata apenas de dar aulas, mas de criar conhecimento novo, o que depende de laboratórios e instalações sofisticados e caros.

O princípio básico que deve nortear as políticas públicas é a priorização de investimentos em educação de qualidade, gratuita e para todos. Inciativa em prol da geração atual e nas que virão para que este país esteja entre as maiores economias mundiais porque não mais ocupa a vexatória 83ª posição no Índice de Capital Humano como acorre atualmente. Portanto, educação não é gasto, mas o mais importante investimento que uma nação pode fazer quando possui governantes, legisladores e juristas de fato comprometidos com o desenvolvimento socioeconômico de sua gente.

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SIGAA - Sistema Integrado de Gestão de Atividades AcadêmicasProfessor Dagoberto Alves de Almeida – ex-reitor da Universidade Federal de Itajubá -UNIFEI – mandatos 2013/16 – 2017-20

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2 thoughts on “Por que a Educação brasileira não melhora? Por Dagoberto Alves de Almeida

  1. Reitor: sempre as mesmas críticas e soluções . Mas iniciamos o século XXI sem estender o ensino médio publico para os adolescentes e jovens. Um país que deu prioridade, desde 2008, para exportação de Commodities, não precisa de ensino de qualidade e muito menos a sua universalização. Visto que a meta de desindustrialização foi alcançada, com início em 2008. Não leio em artigos sobre educação informações quanto ao déficit de professores graduados em Matemática, Física, Química, Biologia e Língua Estrangeira. Quantos professores dessas áreas são precisos para universalizar a Educação Básica até o final do ensino médio? Com o bolsa auxílio de ensino médio, os alunos vão receber certificados de frequência, mas vão continuar analfabetos funcionais. Sem preparo para o ensino superior e muito menos para ingresso no mercado de trabalho. Nos rincões do país como pretender planejar ensino médio sem professores habilitados?

  2. Concordo com o artigo, mas não são apenas os governantes que não estão preocupados com a educação. Recentemente entrei para o campo da educação e pude notar a falta de compromisso e interesse de alguns alunos, o que sinceramente não entendo, pois eles não são obrigados a comparecer e ainda pagam para frequentar o curso. O desinteresse e a falta de respeito pelo professor são aspectos culturais do Brasil. Fico entristecida ao me deparar com alunos assim… Esses alunos demonstram mau humor, comportam-se como se fossem os donos da sala, e nós, professores, somos obrigados a impor autoridade sobre pessoas que estão perto dos 60 anos de idade… Quando o aluno está na sala, a idade não importa para nós professores, mas eu imaginava que a experiência poderia ensinar respeito e educação, o que me choca é a falta de humildade e aquele entusiasmo em buscar conhecimento em alguns. Imagino que deve ser ainda pior na rede pública, pois muitos não desejam estudar, o que dificulta para aqueles que desejam, tornando-se um problema fundamental tanto na base educacional quanto na profissional. Enquanto os brasileiros continuarem agindo assim, infelizmente estaremos sempre atrasados na educação… 😢

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