escravidão

Um Brasil Sem Máscaras*. Por Meraldo Zisman

 UM BRASIL SEM MÁSCARAS *

MERALDO ZISMAN

Você começa a ver que tudo tem uma lógica e um sentido, e que nada é por acaso, não existe acaso… 

120 anos da Abolição da escravidão | Acerto de Contas

*Artigo escrito em 23 de novembro de 2011

A escravidão levou consigo ofícios e aparelhos, conforme sucedeu com outras instituições sociais. Não cito alguns aparelhos senão por se ligarem a certos ofícios. Um deles era o ferro no pescoço; outro era o ferro no pé; e havia, também, a máscara de folha-de-flandres. Esta máscara fazia com que os escravos perdessem o vício da embriaguez, por lhes tapar a boca. Tinha só três orifícios: dois para se poder enxergar, e um para respirar, sendo fechada atrás da cabeça, através de um cadeado.

Extinto o vício do alcoolismo, os escravos perdiam, inclusive, a tentação dos furtos, porque, geralmente, necessitavam dos vinténs dos senhores para “matar a sede”. Sendo assim, extinguiam-se dois pecados ao mesmo tempo, restando, em seu lugar, a sobriedade e a honestidade. É bem verdade que tal máscara era grotesca, mas, sem o grotesco e, alguma vez, o cruel, a ordem social e humana nem sempre foi alcançada. Os funileiros tinham-nas penduradas, prontas para a venda, na porta de suas lojas. O célebre Machado de Assis escreveu, na 3ª pessoa, o conto Pai contra Mãe, publicado em 1906 e, no qual, se refere à escravidão de maneira impressionante e brutal.

No que lhe concerne, pela primeira vez na História do Censo, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) registra que a população brasileira deixa de ser, predominantemente, branca. Mediante os dados obtidos em 2010, apenas 47,73% da população declara ser de cor branca, ao passo que, em Censos anteriores, o percentual é da ordem de 53,74%.

Em 2010, de um total de 190.749.191 pessoas, 91.051.646 declaram ser brancas, o que remete a um grande avanço do psicossocial (palavra que envolve, conjuntamente, aspectos psicológicos e sociais, ou que estuda as relações sociais à luz da saúde mental – Dicionário Houaiss). Neste sentido, quando um povo assume suas próprias ascendências e raízes, sem se envergonhar de suas origens, ele deixa de ser subdesenvolvido. Como psicoterapeuta, eu arrisco afirmar: uma pessoa é sadia, tão-somente, quando permanece feliz do ponto de vista psicossomático, ou seja, dentro de sua própria pele.

Dessa forma, tudo leva a crer que, só agora, a população negra e parda, que sempre procurou “embranquecer”, e/ou costumou declarar ser branca, começou a assumir sua verdadeira cor de pele, sem necessitar de disfarces ou máscaras para poder ocupar um lugar digno dentro da sociedade brasileira.

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Meraldo Zisman Médico, psicoterapeuta. É um dos primeiros neonatologistas brasileiros. Consultante Honorário da Universidade de Oxford (Grã-Bretanha). Vive no Recife (PE). Imortal, pela Academia Recifense de Letras, da Cadeira de número 20, cujo patrono é o escritor Álvaro Ferraz.

 

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1 thought on “Um Brasil Sem Máscaras*. Por Meraldo Zisman

  1. BRI-LHAN-TE Dr. Meraldo. A inquietude das raças em todo o globo, deve-se, exatamente, a falta de admissão dos povos ocidentais, em não admitir que, desde sempre houve Escravidão. Muito obrigada, mesmo.

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