últimas consequências

As últimas consequências podem ser fatais. Por Aylê-Salassié F. Quintão*

AS ÚLTIMAS CONSEQUÊNCIAS PODEM SER FATAIS

AYLÊ-SALASSIÉ QUINTÃO

 O futuro nem chegou e o governo, com milhares de famintos batendo às suas portas e os estados e municípios quase insolventes, já anuncia que está quebrado.  Não estamos sós…

Viciado em opiniões e leituras acadêmicas, qual não foi minha surpresa recente, ao consultar, por curiosidade, um grupo de analistas de mercado da Seeking Alfa (Nova York), e deparar com gente altamente antenada na realidade conjuntural global e que se encaixa perfeitamente na realidade brasileira atual.

Impressionaram-me particularmente as projeções do analista Andrés Cardenal – não sei se é doutor, mestre ou especialista – seguido por onze mil investidores ao redor do mundo. Do seu portfólio consta que, em 2020, ano da pandemia, ele bateu o mercado por 5 a 1, em acerto nas projeções econômicas, disponíveis somente no Data Driven Investors, para assinantes da newsletter digital.

Cardenal fala agora dos efeitos do Covid. Sugere uma revisão do cenário de investimentos para este ano (edição de 2020, 07.01.2021). Pontua que as medidas restritivas dos governos no ano passado afetaram importantes segmentos da economia global, apontando para uma recessão. Lembra que as iniciativas sem precedentes dos governos e dos bancos centrais tentando mitigar a crise não impactou diretamente, mas resvalou nas grandes corporações, no mercado imobiliário e no financeiro.

 Pior, gerou uma desconexão com as economias saudáveis, que elevaram em 20%, U$14 trilhões, o suprimento de dinheiro no mercado. Com isso o déficit fiscal global, dos governos, cresceu para 13% do PIB, conforme vem mostra o FMI.

 Surgido subitamente,  o Covid, que  infectou, até agora, 80 milhões de pessoas no mundo, com 1,8 milhão de mortes, vem se mostrando como um  dilema para os governos  do mundo que, em 2020, teve de optar entre a saúde pública ou a economia, levando à maior contração econômica em 75 anos. Os incentivos financeiros e a liberdade de expansão do déficit público produziu efeitos efêmeros e, ao contrário do que se esperava, desencadeou uma pressão sobre os custos e uma acumulação espantosa de débitos. Os gastos de governo suavizaram o golpe para as empresas e famílias e até deram uma ilusão de riqueza e prosperidade para quem opera no mercado de capitais.

 Contudo, embora ainda pouco claro, nos anos vindouros a sociedade poderá vir a ser vítima das consequências danosas de algumas dessas iniciativas atenuantes do presente. As correntes economicistas e, sobretudo, as políticas, que defendem essa expansão artificial da base monetária como um empréstimo para o futuro, poderão ter dificuldades de encontrar uma saída justa e democrática para o aumento rápido e desastroso do nível de endividamento, dos preços abusivamente distorcidos e o redirecionamento do capital para usos improdutivos

 Há um visível agravamento da degradação das moedas fiduciárias – títulos não-conversíveis, sem lastro material, emitidos com base na confiança entre as pessoas: uma ordem de pagamento, títulos de crédito, dinheiro de papel, entre outros, alimentando o descrédito social e nos negócios. Criam inflação nos preços dos ativos, exarcebando a  desigualdade e as tensões sociais. Não se deve esquecer a iniciativa dos “fiscais do Sarney”: Basta um grito na multidão.  Um governo sério preparar-se-ia para quando esse carnaval se esgotar, e não ignoraria as projeções do planejamento das políticas públicas. Analistas, como Cardenal enfatizam a necessidade de se enxergar aquilo que não se vê em tudo que se vê (Bastiat…).

Pequenas coisas, atos impulsivos, casuísticos, voltados para administrar questões temporárias e específicas, tendem a produzir efeitos imprevistos.

Qualquer iniciativa pontual precisa ter seus efeitos futuros projetados e avaliados: consequências imediatas podem ser favoráveis, mas as últimas podem ser fatais para as economias, para os governos e até para os regimes políticos. Um pequeno bem no presente poderá ser seguido por uma catastrófica mudança no por vir.  Olhando para 2020, parece que por aqui não houve, nem tem havido, preocupação com políticas de efeitos futuro.

O déficit de U$ 260 bilhões no Orçamento e a dívida de U$ 500 bilhões dos estados, inadimplentes, vai sendo deglutido irresponsavelmente por todos. Geram-se moedas e facilita-se endividamentos como se fossem algo corriqueiro. Ignoram-se os riscos significantes pela frente.

Lamentavelmente, visões levianas tem sido a resposta a todo e qualquer indício de estresse econômico e financeiro.  A escolha mais popular tem sido a opção para os economistas gestores das políticas públicas.  Quando não dão certo, defendem-se dizendo comodamente que a  “crise teria sido pior sem nossas ações”. É aí que os acadêmicos entram, enfim, em campo.

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Aylê-Salassié F. QuintãoJornalista, professor, doutor em História Cultural. Vive em Brasília

 

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