feminicidios - cartaz Bowling Saturne

Bowling Saturne: feminicídios em série. Por Rui Martins

… o espectador do filme Bowling Saturne, na competição internacional do Festival de Cinema de Locarno, sabe quem é o criminoso, viu mesmo como ele convence as garotas a irem ao seu apartamento. Mas a polícia quebra a cabeça…

Cobertura especial do Festival de Cinema de Locarno

Patricia Mazuy - AdoroCinema
Patricia Mazuy, diretora francesa, de Bowling Saturne

De repente nos arredores das cidades de Deauville e Caen, na Normandia, no norte da França, aparecem, em lugares diferentes, embrulhadas em plásticos azuis, jovens mulheres assassinadas com requintes de grande violência. O espectador do filme Bowling Saturne, na competição internacional do Festival de Cinema de Locarno, sabe quem é o criminoso, viu mesmo como ele convence as garotas a irem ao seu apartamento. Mas a polícia quebra a cabeça, sem descobrir traços ou indícios capazes de levar ao feminicida, e só no fim do filme consegue identificar uma das vítimas.

Quem se ocupa das investigações é o inspetor Guillaume, policial meticuloso mas um tanto solitário, não se vê ao seu redor nenhuma mulher. A série de assassinatos é grave e tudo leva a crer ser cometida por algum maníaco, sempre disposto a recomeçar, se não for descoberto. Enquanto isso, o espectador trava conhecimento com a outra atividade de Guillaume, a de proprietário de um Bowling, recebido como herança de seu pai. Uma atividade que lhe toma tempo, mesmo com empregados para ajudá-lo e da qual pensa se desfazer, procurando um comprador.

Por isso, é com certo alívio que vê ressurgir seu meio-irmão, filho adulterino do pai, um tanto mais jovem, meio perdido na vida e desempregado, com o qual nunca teve maior contato. Armand, seu nome, aceita administrar o bowling e se mostra satisfeito por ter, enfim, um trabalho e alguma coisa séria para fazer na vida e imagina mesmo como aumentar as receitas desse lugar de divertimento. Armand ganha também um apartamento de função, onde antes vivia seu pai.

Bowling Saturne, filme francês da cineasta Patricia Mazuy, que em 1994 já havia ganhado o terceiro prêmio, chamado de Leopardo de Bronze, na competição do Festival de Locarno com o filme Eu e Travolta (Travolta et moi). Esse novo filme é um thriller, com um enredo ou história à la française, mas com cenas de violências mais próprias dos filmes policiais norte americanos. Bowling Saturne foi exibido no começo do Festival e se manteve como um dos violentos da competição.

O objetivo de Patricia Mazuy é mostrar como a violência masculina é ainda marcante na sociedade. Mas o filme explora um outro aspecto, aparentemente desvinculado das investigações sobre o serial killer. O pai de Guillaume e de Armand era um aficionado da caça e pertencia mesmo a um grupo de caçadores organizadores de safáris na África, com o objetivo de matar grandes animais selvagens como leões, tigres, levando troféus dessas caçadas e filmando a morte dos animais. Um encontro com projeções desses filmes mostrava o júbilo desses caçadores, agora idosos, no momento de terem abatido esses animais sem outros objetivos senão o prazer de matá-los.

Embora Armand tivesse sido abandonado pelo pai, acaba com ele se identificando ao vestir sua roupa de caçador feita de pele de uma grande cobra piton. Entretanto, em lugar de caçar animais, preferia caçar jovens indefesas frequentadoras do bowling. Depois de levá-las ao seu apartamento, o romantismo inicial era substituído por uma relação sexual violenta, sendo mortas a seguir a pancadas, sem qualquer razão, por uma pulsão violenta, como os animais selvagens caçados e abatidos por seu pai.

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Rui Martins, especial, direto do Festival Internacional de Cinema de Locarno

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Náufrago da Utopia: RUI MARTINS: BRECHT O CHAMARIA DE "IMPRESCINDÍVEL"Rui Martins – é jornalista, escritor, ex-CBN e ex-Estadão, exilado durante a ditadura. Criador do primeiro movimento internacional dos emigrantes, Brasileirinhos Apátridas, que levou à recuperação da nacionalidade brasileira nata dos filhos dos emigrantes com a Emenda Constitucional 54/07. Escreveu “Dinheiro Sujo da Corrupção”, sobre as contas suíças de Maluf, e o primeiro livro sobre Roberto Carlos, “A Rebelião Romântica da Jovem Guarda”, em 1966. Vive na Suíça, correspondente do Expresso de Lisboa, Correio do Brasil e RFI.

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