sol decolagem

Promessas de sol. Por Alexandre Schwartsman

Apesar das promessas de decolagem, a aeronave segue firme no chão, como indicado pelo IBC-Br. Embora a vacinação impulsione os serviços, varejo e indústria permanecem fracos, minados pela inflação alta e – mais à frente – a elevação da taxa de juros.

Grande avião sai da pista do aeroporto contra grande pôr do sol ou nascer do sol de Egoroff na Envato Elements

PUBLICADO ORIGINALMENTE NA INFOMONEY, EDIÇÃO DE 20 DE OUTUBRO DE 2021

Parece claro que a prometida decolagem da economia brasileira, como sói acontecer com as juras do ministro da Economia, ficou na pista. O IBC-Br, calculado pelo Banco Central de forma a condensar num único indicador o desempenho da economia, de alguma forma buscando antecipar o comportamento do PIB, revela uma economia estagnada, como se vê no gráfico abaixo.

Fonte: BCB

Após retornar na virada de 2020 para 2021 aos níveis que vigoravam antes da crise, o IBC-Br mostra a economia andando de lado. De janeiro a agosto deste ano o índice – ressalvadas flutuações de pequena monta – não saiu do lugar. Obviamente, comparado ao ano passado, quando a atividade chegou a cair 14% em apenas dois meses, a expansão ainda é considerável: +6,4% nos primeiros oito meses de 2021. Isto, contudo, diz mais sobre a fraqueza da atividade em 2020 do que sua pujança em 2021.

Isto dito, da mesma forma que a recuperação da economia foi bastante descompensada, a estagnação de agora esconde considerável assimetria. Do fundo do poço até o final do ano passado, a produção da indústria de transformação cresceu nada menos do que 50%, impulsionada em boa medida pela expansão de 40% das vendas no varejo no mesmo período. Ambos os indicadores superavam os níveis pré-crise no último trimestre de 2020.

Em contraste, o setor de serviços – afetado pela necessidade de distanciamento social – mostrou expansão muito mais tímida naquele momento, perto de 17%, insuficiente para recuperar o patamar observado em fevereiro. Em particular, o segmento de serviços prestados a famílias (principalmente alimentação e hospedagem), que caíra quase 60% nos primeiros meses da epidemia, produzia ainda 30% a menos do que no início do ano.

A partir de abril, todavia, seu desempenho mudou. Estimulado principalmente pela recuperação dos serviços prestados às famílias (+37%) e transporte aéreo (que mais do que dobrou no período), o setor finalmente superou seu patamar pré-crise, enquanto aqueles ligados ao consumo e produção de bens (vendas no varejo e indústria de transformação) encolheram ou estagnaram, dependendo do ponto de partida da análise. O gráfico abaixo resume a evolução dos principais indicadores de atividade.

Fonte: Autor (com dados do IBGE)

A assimetria de 2020 persiste, portanto, embora com o sinal trocado.

O principal suspeito por esta mudança é o avanço da vacinação. Até abril pouco mais de 10% da população havia recebido a primeira dose da vacina; de lá até agosto esta proporção subiu para 60% (hoje supera 70%). Isto permitiu a reabertura de atividades como bares e restaurantes, assim como dos demais serviços prestados a famílias.

A renda das famílias, outro possível suspeito, a bem da verdade não evoluiu, pressionada pela inflação alta e recuperação ainda insuficiente do emprego (como exposto no gráfico acima), apesar do progresso no trimestre terminado em julho, também resultado – como explorei recentemente – da aceleração da vacinação.

(Ah, se aquele e-mail da Pfizer tivesse sido respondido a tempo!).

Olhando à frente, o bom desempenho comparativo dos serviços deve persistir. A vacinação avança e, na sua esteira, a demanda por eles. Embora o ritmo de expansão não deva se manter, é razoável imaginar a continuidade da recuperação, com efeitos positivos sobre o nível de emprego.

Por outro lado, a inflação alta, portanto a corrosão do poder de compra dos salários, e a necessidade de elevação da taxa de juros para contê-la devem seguir pesando do lado da demanda por bens. Isto aponta para aumento bastante modesto da atividade econômica a partir do quarto trimestre, consistente com crescimento na casa de 1-1,5% para 2022.

Apesar das promessas, o avião não consegue voar muito mais do que isto.

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* ALEXANDRE SCHWARTSMANDOUTOR EM ECONOMIA PELA UNIVERSIDADE DA CALIFÓRNIA, BERKELEY, E EX-DIRETOR DE ASSUNTOS INTERNACIONAIS DO BANCO CENTRAL DO BRASIL É PROFESSOR DO INSPER E SÓCIO-DIRETOR DA SCHWARTSMAN & ASSOCIADOS

@alexschwartsman
aschwartsman@gmail.com

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