Feira livre, xepas e droguitas. Por Marli Gonçalves

Era um governo. Era, admitimos, um projeto de poder que ao menos pretendia diminuir a miséria e desigualdade. Mas desde o início da chegada ao Poder, quando podiam fazer e realizar as coisas e os sonhos, 14 anos atrás, e até pouco antes, já se sentia no ar alguma coisa errada. Ora apareciam se lambuzando estranhamente num mundo burguês, ora um ou outro até por ser mais purista ou ingênuo saía espirrado do grupo, e saía atirando, alertando.

Do que eram chamados, ou do que ainda são chamados os que não estão mais em suas fileiras? De loucos. De traidores. Do que são chamados todos, e de forma indiscriminada, os que agora veem e tentam salvar as coisas indo barranco abaixo – sim, as coisas e o país estão indo barranco abaixo – os que registram dia a dia a falência total? De golpistas. Ah, e de nazistas, racistas, machistas, fora os palavrões cabeludos que devem falar em quatro paredes. Sim, nazistas, ouvi um celerado desse outro dia acusar. De gagás, ouvi uma deputada chamar um respeitável advogado. Pouco importa se a sua história também foi a deles por muito tempo – pedem respeito, mas não sabem o que é isso. Bateu o desespero. E eles montaram uma feira livre, cheia de barraquinhas de negociar cargos, e o tal poder. Poder esse que de pouco adiantará se obtido assim, se mantido. Será poder sem paz, sem futuro.gif-animados-profesiones-vendedor-ruta-39254Golpes de marketing martelando cabeças, com cor, slogan #nãovaitergolpe, alguma ajuda de custo, patrocínio de algo, robôs digitais, distribuição de bandeirinhas, camisetas, sanduíches, água, e à frente pobres, de preferência negros, mulheres, camponeses ou sem-terra, ou sem-alguma coisa, de carteirinha. Uns “coletivos” disso, daquilo. Inflamados. Os tais “jornalistas livres”, e que um dia entendo do que vivem, irradiando as manifestações organizadinhas como se fossem a entrada gloriosa dos justos nos céus. Líderes de centrais sindicais, de sindicatos pagos com taxa obrigatória que cai todo mês lá no caixa, escoada do salário dos trabalhadores, inclusive a nossa, os jornalistas PIG-PEG-PUG, que ou trabalham para os jornais e revistas que podem ser comprados em bancas, ou se sustentam no limiar da liberdade. Pronto. Um palanque e muita gritaria e ameaça, além de discursos cheios de ódio, perdigotos e erros de português. Os artistas comovidos encheram os olhos de água. Os progressistas e toda sorte de rótulos da esquerda do tempo do onça saíram bradando junto, em coro, como se não vissem que o país está à venda, à beira do abismo. Na hora da xepa. Sendo trocado por bananas.

Essa é a parte que não consigo entender. Acho lindo acreditar ainda em ideologias, em ideais. Mas porque, então, não estamos juntos os que querem resolver o problema com seriedade? – Sim, temos um problema e ele é gigantesco, avassalador. Porque não ter a dignidade e a humildade de tentar juntar ao invés de diariamente forçar dividir? Eduardo Cunha não estaria lá. As instituições não estariam sendo tão feridas. Se há golpistas no meio disso tudo, e deve haver mesmo que tem maluco para tudo, seriam mais facilmente neutralizados em suas muitas e repugnantes ignorâncias que todo dia também me escandalizam.

Mas ao contrário: provocam, cutucam os instintos mais primitivos, desrespeitam leis, confundem o Estado e a Nação com partidos, fazem de palácios palanques inflamados, pesam a mão. Vendem um peixe que não pescaram.

Não o fazem – buscar a união – porque não querem. Cada dia isso fica mais claro. Montaram barracas e estão vendendo acarajés e seus pastéis de vento, literalmente tomados com caldo de cana.

Nas planilhas dos empreiteiros e doações, nomes, que associados aos pagamentos ainda ganharam fantásticos apelidos, como na feira um e outro feirante costuma usar, mas os deles são mais suaves – alemão, negão, dona maria, curíntia. No mundo político, caranguejo passeava com passivo (!), nervosinho anda lado a lado com rico e proximus. Com acessos de bom humor nas definições, avião era a deputada comunista bonita; 333, a meia besta, o José Serra. Jarbas Vasconcelos, o que não pode ver uma miss que casa com ela, chamado de viagra.

Empreiteiros lidavam com todos e os juntavam, sempre hábeis, com rejunte, com seu cimento particular. Presos ou impossibilitados agora de exercer qualquer autoridade não existem mais laços – é o salve-se quem puder. Daí as cenas de pugilato que assistimos diariamente.

Como numa feira, cada um grita mais para atrair o cliente. Oferece ministério como se fosse laranja descascada. E frutas nobres, como a Saúde e a Educação, entram na barganha. Do outro lado, se ofertam possibilidades, previsões. Ficção.

Mas, mesmo nessa feira, é preciso que notem, já chegou a hora da xepa. O fim da feira quando os restos que talvez já não servirão para muito mais coisas serão ofertados. Não adianta mais. As barracas que estão tendo mais frequência são aquelas dos cantos, as que consertam os cabos das panelas velhas que tilintam das janelas. Logo também haverá fila nas de flores que serão levadas ao enterro dessa era de excrecências que se transformou o tal governo popular.

Melhor mesmo que seja apenas esse o sentido da xepa; melhor que ser comida de militar, jornal já lido, com notícias daqueles tempos horríveis lá de trás.

São Paulo, um abril que pode fechar se continuar nessa toada, 2016
Marli Gonçalves, jornalista Quanto ao tarja preta que a presidente odiou dizerem que está tomando, e que ainda deverá ficar até 12 % mais caro esses dias como todos os remédios, a proposta é que, se possível, seja socializado algo parecido a todos os brasileiros. Estamos todos esquizofrênicos, ansiosos, perturbados, alternando momentos de euforia e depressão.

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