Dez anos sem o Mestre Telê. Coluna Mário Marinho

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Poucos homens na vida amaram tanto o futebol como Telê Santana.

Poucos homens na vida entenderam tanto a arte do futebol como Telê Santana.

Poucos homens na vida foram tão sérios em sua profissão como Telê Santana.

No dia 1º de julho de 1983, uma sexta-feira, passei duas horas com Telê Santana, ao lado do jornalista Roberto Avallone, nos estúdios da rádio Eldorado, em São Paulo.

Gravamos um programa especial que foi ao ar no dia 5 de julho, relembrando a tragédia de Sarriá, acontecida um ano antes, quando o Brasil foi eliminado da Copa de 1982, na Espanha, pela então frágil Seleção da Itália, que acabou campeã daquela Copa.

Relembramos os jogos do Brasil naquela Copa (vitórias sobre a União Soviética, 2 a 1; sobre a Escócia, 4 a 1; sobre a Nova Zelândia, 4 a 0; o maravilhoso 3  1 sobre a Argentina), todos os lances daquele triste jogo contra a Itália, quando perdemos por 3 a 2 e voltamos para o Brasil, deixando os amantes do futebol órfãos de um futebol que foi pura arte.

Telê se emocionava ao ouvir a voz de Osmar Santos nas gravações dos jogos, ali no estúdio.

– Um ano depois, Telê, o que Você mudaria naquele jogo?

– Se eu pudesse, mudaria só o placar. Seria o mesmo time, o mesmo modo de jogar, a mesma determinação.

– O mesmo futebol arte?

– Sim, o mesmo futebol arte.

– E a mesma derrota.

– Sabe, eu já vi e revi aquele jogo diversas vezes. Não houve erros estruturais, de esquema, nada disso. Tivemos erros pontuais. Mas penso que se estivéssemos jogando até hoje, ainda estaríamos atrás no placar. Mas, se jogássemos outra vez, não perderíamos.

Tele lembrava a Copa de 82 não com mágoa, apenas com a tristeza de não ter chegado aonde imaginava que chegaria com o futebol arte pura que a Europa chamou de outro mundo.

 – O futebol tem dessas coisas, coisas que agente não explica, disse ele.

Depois da gravação do programa, descemos até um bar na rua Major Quedinho, o “Mutamba”, onde ficava o estúdio da rádio Eldorado, para um cafezinho. Eu e o Avallone, sabendo da fama de pão duro do Telê, resolvemos testá-lo e combinamos não pagar o cafezinho.

Telê não se fez de rogado, ficou conversando encostado ao balcão sem fazer o menor gesto em direção ao bolso. Vimos que não tinha jeito e resolvemos pagar. Mas o dono do bar não deixou:

– Seu Telê o senhor vir aqui quantas vezes quiser. O senhor me deu muita alegria, nunca pagará despesa nenhuma aqui.

Contamos ao Telê que, propositadamente, também não fizemos nenhum gesto em direção ao bolso para ver se ele pagaria. Sorriu seu sorriso bonito, franco e explicou.

– As pessoas dizem que eu sou pão duro, mas não é nada disso. É que eu me esqueço de pegar dinheiro quando saio. Acho que nós íamos ficar por aqui muito tempo, pois estou sem um tostão…

Telê era determinado. Em 1979, dirigindo o Palmeiras transformou um amontoado de jogadores apenas razoáveis num time que jogava bonito e que massacrou o Flamengo no Rio, 4 a 1. Baroninho era o ponta esquerda desse time, um jogador que tinha como habilidade apenas o chute forte. Pois Telê passava horas e horas com Baroninho explorando o seu chute em cobranças de faltas e de escanteios. Baroninho virou peça fundamental.

Cafu, no São Pulo, só se transformou num grande lateral direito depois de treinos e mais treinos com Telê gritando com ele à beira do gramado do Morumbi. Telê deixava um cone na lateral do gramado e mandava Cafu correr com a bola do meio do campo até aquele cone e cruzar. A jogada era e foi repetida à exaustão, até fazer de Cafu um lateral com ótimo aproveitamento em seus cruzamentos.

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O Fio

de Esperança

 

Telê Santana da Silva nasceu na cidade de Itabirito, Minas Gerais, em26 de julho de 1931 e morreu Belo Horizonte, no 21 de abril de 2006.

Começou sua carreira de jogador profissional de futebol em 1949, no Fluminense carioca. Os primeiros chutes foram dados no América Futebol Clube de São João Del Rey, bela e histórica cidade mineira.

Era um ponta direita franzino e ao contrário dos pontas de sua época, não era driblador mas, sim, um ponta que gostava de recuar e ajudar o meio campo.

No Fluminense, tinha apelidos pejorativos como “Fiapo” ou “Tarzan das Laranjeiras” por seu físico franzino.

Foi então, que o jornalista Mário Filho, diretor do Jornal dos Sports, propôs aos leitores um concurso para um novo apelido para aquele jogador que a torcia gostava tanto.

Três apelidos se destacaram: “El todas“, “Big Ben” e “Fio de Esperança“. O último foi o preferido.

Depois de jogar no Guarani-SP, Vasco e Madureira, Telê encerrou a carreira de jogador e começou a de treinador no Fluminense, em 1969.

No Fluminense, os jogadores não podiam entrar ou sair do clube pelas portas sociais mas, sim, pelas portas de serviço, já que eram empregados.

Certa noite, Telê ficou em reunião da diretoria até tarde. Ao sair, a porta de serviços estava trancada. Pediu para que a abrissem e foi informado de que ele não era jogador e podia sair pela social.

Telê se recusou e pulou o muro. Daí para frente, os jogadores foram autorizados a usar as portas sociais.

Foi o vencedor do primeiro Campeonato Brasileiro, em 1971, dirigindo o Atlético Mineiro. Aliás, é, até hoje o técnico que mais dirigiu o Galo: 434 jogos oficiais.

Além da Copa de 1982, Telê dirigiu a Seleção também na Copa de 1986, quando foi eliminada na disputa de pênaltis contra a França.

A partir daí, ganhou a fama de “pé frio” que durou pouco tempo, graças à sucessão de títulos que acumulou em sua carreira.

O ponto alto dessa carreira foi no São Paulo, time que dirigiu por 411 jogos e conquistou 10 títulos oficiais e outros 11 torneios amistosos.

Mestre Telê Santana ainda dirigia o São Paulo quando, em janeiro de 1996 sofreu isquemia cerebral que prejudicou sua fala, sua locomoção e até seu entendimento.

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FOTO SOFIA MARINHO

 

Mario Marinho É jornalista. Especializado em jornalismo esportivo foi durante muitos anos Editor de Esportes do Jornal da Tarde. Entre outros locais, Marinho trabalhou também no Estadão, em revistas da Editora Abril, nas rádios e TVs Gazeta e Record, na TV Bandeirantes, na TV Cultura, nas rádios 9 de Julho, Atual e Capital. Foi duas vezes presidente da Aceesp (Associação dos Cronistas Esportivos do Estado de São Paulo). Também é escritor. Tem publicados Velórios Inusitados e O Padre e a Partilha, além de participação em  livros do setor esportivo

A COLUNA MÁRIO MARINHO É PUBLICADA TODAS AS SEGUNDAS E QUINTAS AQUI NO CHUMBO GORDO.

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1 thought on “Dez anos sem o Mestre Telê. Coluna Mário Marinho

  1. Foi ótima, amigo Marinho, essa sua lembrança de Telê Santana.
    Quando era adolescente, eu lia revistas cariocas que falavam dele e depois, claro, ele já técnico da seleção, o admirei muito.
    Valeu muito, amigo.
    Abração de sempre.
    Toinho.

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