“O bom exemplo”. Por Andrés Oppenheimer*

Publicado originalmente no "Miami Herald"

Parabéns! Num momento em que vários presidentes latino-americanos promovem descarado culto à personalidade, o presidente da Costa Rica, Luís Guillermo Solís, assinou decreto que proíbe a exibição de seu retrato em escritórios públicos e a inclusão de seu nome em placas de inauguração de obras.

De acordo com o decreto de Solís, as placas conterão apenas a data da inauguração, sem nome de governantes.

“As obras públicas são do país e não de um Governo ou de um funcionário em particular”, disse Solís. “O culto à imagem do presidente acabou, pelo menos durante meu Governo”.

… Que diferença de outras nações latino-americanas! Em vários países da região, os presidentes usam boa parte de seu tempo e dos recursos estatais em campanhas de autoglorificação, em muitos casos para tentar eternizar-se no poder…

O chefe do Gabinete Civil da Costa Rica, Melvin Jiménez, disse que a decisão se baseou na plataforma da campanha de Solís. “Não há motivo para colocar o nome do presidente em nenhuma obra pública, porque as obras públicas são pagas pelo povo da Costa Rica com seus impostos. E não há motivo para afixar seu retrato em gabinetes públicos porque as decisões de Governo não são tomadas por uma única pessoa, mas por um conjunto que inclui ministros, vice-ministros e outros funcionários”.

Que diferença de outras nações latino-americanas! Em vários países da região, os presidentes usam boa parte de seu tempo e dos recursos estatais em campanhas de autoglorificação, em muitos casos para tentar eternizar-se no poder.

Na Venezuela, onde o falecido presidente Hugo Chávez iniciou o atual ciclo de culto à personalidade na região, o atual presidente Nicolás Maduro distribui milhões de livros escolares que endeusam Chávez e glorificam o próprio Maduro. Nas escolas, distribui-se uma Constituição Ilustrada da Republica Bolivariana da Venezuela com ilustrações em que Chávez, com sorriso paternal, brinca com crianças, sob o título “Suprema Felicidade”.

Outra ilustração mostra Chávez como se fosse Deus, olhando do céu para a Terra, onde um imponente Maduro levanta os braços num gesto de triunfo e mostra a faixa presidencial nas cores da bandeira venezuelana. O título da ilustração é “Democracia”.

No Equador, o presidente Rafael Correa, cujo partido quer mudar a Constituição para que ele possa se reeleger indefinidamente, não apenas censura a imprensa que o critica como exige que os jornais falem bem dele.

A Superintendência da Informação e Comunicação do Equador acaba de convocar os jornais “El Universo”, “El Comercio” e “Hoy” para uma audiência na qual deverão explicar por que nada informaram sobre um título de Doutor Honoris Causa concedido a Correa por uma universidade chilena. Correa já havia reclamado, em discurso de 17 de maio, da falta de cobertura jornalística da outorga do diploma.

Na Bolívia, o presidente Evo Morales publicou há pouco um livro infantil, “Las aventuras de Evito”, em que recria sua infância. O livro, escrito pela ex-chefe de Gabinete de Morales, Alejandra Claros Borda, se compõe de cinco histórias curtas (entre elas, “Evito vai à escola”, “Evito joga futebol” e “Evito e o burrinho tricolor”) e foi distribuído pelo Ministério da Educação, em grande parte gratuitamente.

Na Argentina, Cristina Kirchner batizou tantas ruas, pontes e edifícios com o nome de seu falecido esposo, Néstor, que o jornalista Leonardo Míndez, do jornal “Clarín”, criou um blog chamado “Ponha o nome de Néstor em tudo”. O blog inclui quase cem obras públicas com o nome de Néstor Kirchner, inclusive a usina nuclear Atucha 2 – que acaba receber o nome – sim, adivinharam! – de Presidente Néstor Kirchner. O Governo argentino investiu mais em propaganda durante partidas de futebol na TV, informam políticos oposicionistas, do que em Saúde ou Educação.

Minha opinião: a Costa Rica impôs uma derrota ao culto à personalidade na América Latina. Como bem disse o presidente da Costa Rica, “as obras públicas se financiam com dinheiro dos contribuintes, que encarregam os governantes de executá-las e administrá-las. É hora de liquidar o absurdo culto à personalidade promovido pelos presidentes de Venezuela, Equador, Argentina e Bolívia, entre outros. Não se trata de mero exibicionismo de presidentes tropicais que se inebriaram com a alta dos preços mundiais das matérias primas, mas sim de desperdício maciço de fundos públicos e de intoxicação ideológica de muitas mentes.

Algum dia, esses presidentes deverão prestar contas de cada centavo do Tesouro que usaram para polir sua própria imagen.

Até lá, há que aplaudir a Costa Rica.

*Andrés Oppenheimer Jornalista argentino, mora nos Estados Unidos e já ganhou um Prèmio Pulitzer. É editor de América Latina e colunista do jornal “Miami Herald” e analista político da CNN em espanhol. Comanda o programa “Oppenheimer Apresenta”.

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