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A mentira como norma. Por Edmilson Siqueira

 

…Bolsonaro e suas quadrilhas têm praticado à larga, agora até assessorados por gabinetes de crise e grupos de “midia training” para que a famosa perna curta da mentira não apareça em meio aos depoimentos. 

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Um governo ruim se caracteriza pela mentira. Claro, há outros fatores que identificam os governos ruins, mas a mentira se sobrepõe a todos os outros, pois é a personificação da falta de qualidade transformada em triunfo dos governos medíocres.

Lula mentia descaradamente sobre vários assuntos. Sempre que era apanhado em flagrante delito – ele e sua cambada – e não foram poucas as vezes em que isso aconteceu, ele usava o velho discurso, mentiroso até o último fio de cabelo, de que estavam tentando derrubá-lo. O sujeito oculto na frase variava entre poucas opções. Ora era a direita, ora era a elite, ora eram os derrotados. Sobrava até para a Rede Globo, que nunca quis derrotá-lo, pelo menos depois que ele foi eleito, apenas mostrava a roubalheira que grassava impune por aí sob o comando do Nove Dedos.

Para mentir e se manter no poder sem ser incomodado pela verdade, Lula e sua cambada construíram um novo discurso, mentiroso também, que se destinava a enganar quem fosse pouco afeito às mumunhas e truques das velhas raposas políticas. Pagava-se a um bom número de jornais, revistas, e emissoras de rádio e TV (com dinheiro público, claro, disfarçado de publicidade oficial) para mentir ou para elogiar o governo ou para destruir adversários. Nesse último mister entravam principalmente os blogs sujos, ainda incipientes perto do que são hoje, mas suficientes para fazer um barulho danado na arte de destruir reputações.

Talvez poucos se lembrem de Lula, na França, quando estourou o escândalo da Mensalão. Para surpresa geral, Lula resolveu falar sobre o assunto. Mas não para a grande imprensa brasileira que estava cobrindo a viagem e sim para uma desconhecida jornalista que, obviamente, fez as perguntas que lhe mandaram fazer e calou-se sobre qualquer “pergunta difícil” que fatalmente seria feita fossem os jornalistas normais que o entrevistassem.

E com a maior cara de pau, Lula disse que o que foi feito na campanha foi o que todos os partidos faziam, que era caixa 2. A frase é verdadeira, aliás. Todos os partidos existentes à época – e a maioria está aí até hoje – faziam dos “recursos não contabilizados” a própria vida partidária, além de produzir o enriquecimento dos donos dos partidos. Só que a mentira não estava na frase e sim no que o PT estava realmente fazendo: era dinheiro público usado para comprar políticos, a velha e conhecida corrupção que acabou percorrendo todo o governo petista e fez Lula ser reeleito, bem como sua sucessora, em três eleições sucessivas que significaram 14 anos do PT no poder, estragando o Brasil e fechando o caminho de um desenvolvimento sustentável que era possível à época. A mentira de caixa 2 surgiu porque se tratava, à época, de crime menor, punível com pequena multa e sem maiores consequências para seus autores. Collor já havia usado um argumento parecido: “sobras de campanha”, lembram?

Portanto, as mentiras que hoje vemos estampadas na cara de praticamente todos os membros da quadrilha bolsonarista no poder, têm raiz recente na memória brasileira. Além das mentiras, os métodos sujos para se manter no poder continuam os mesmos. Primeiro compram-se os candidatos a presidente da Câmara e do Senado. Depois, distribuem-se  ministérios e cargos – e muito dinheiro – aos partidos para que eles apoiem o governo. Foi o que o PT fez. É o que Bolsonaro faz. E a rede de blogs sujos cresceu e sofisticou com a expansão das ferramentas tecnológicas da internet. Mas no fundo é a mesma formação de quadrilha que o brasileiro já está cansado de ver.

Há algumas poucas diferenças: o roubo do dinheiro público hoje, por exemplo, está mais institucionalizado, através de um orçamento camuflado que o relator do próprio distribui conforme as ordens recebidas de seus chefes. Tem aparência de legal, mas é imoral até a alma. Mas a velha propina nas compras superfaturadas não mudou nada. As recentes denúncias sobre compras de vacinas “por fora” são a prova cabal de que as corriqueiras quadrilhas especializadas em afanar o erário continuam ativíssimas. Não foi por mera coincidência que o bolsonarismo se uniu ao petismo para acabar com a Lava Jato e tentar desmoralizar a força-tarefa e o ex-juiz Sergio Moro. A motivação para a perpetuação da impunidade é comum a ambas as quadrilhas.

As mentiras todas que temos ouvido na CPI da Covid, portanto, não são um método novo de tentar se manter no poder cometendo crimes sem ser punido. Elas fazem parte de uma maldição da política brasileira, que sempre existiu, claro, mas que o PT aperfeiçoou – como aperfeiçoou a corrupção, diga-se – e que Bolsonaro e suas quadrilhas têm praticado à larga, agora até assessorados por gabinetes de crise e grupos de “midia training” para que a famosa perna curta da mentira não apareça em meio aos depoimentos.

Mas acabam aparecendo por conta do avanço da tecnologia, o que não existia na era petista e que, provavelmente, ajudou a petralhada a roubar tanto e ficar tanto tempo no poder. Hoje, uma conversa de meses atrás pelo WhatsApp, mesmo apagada pelo dono do celular, pode ser revelada integralmente. As ligações telefônicas podem ter seus destinatários conhecidos e até o local em que o suspeito estava em tal dia e tal hora são possíveis de se saber facilmente desde que ele carregasse um smartphone.

Enfim, a luta contra a mentira continua e só quando a verdade for desvendada é que poderemos nos livrar das pestes que têm nos assolado em forma de governos.

A esperança é a última que morre, acho eu.

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Edmilson Siqueira é jornalista

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